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quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Quatro anos de silêncio

Sentado no sofá, como tanto gostava e caso o gato não o disputasse com ele de olhar fixo e penetrante, orelhas perfiladas e um leve inclinar da cabeça para um dos lados, o meu pai seria incapaz de aceitar com calma os desígnios recentes deste nosso Portugal. Dono de um feitio apurado que, adianto, é genético e contagioso, o meu pai teria feito tudo excepto ficar impassível e, muito importante, calado. Primeiro uma crítica suave, cautelosa. Talvez na entrada Nonô, ouviste o Sócrates ontem? Depois em crescendo, Olha, tu ouviste-o ontem? sempre em crescendo Ai Santo Deus, as coisas que se dizem e depois a confirmação Palavra de honra, não têm vergonha? mais tarde a certeza Está pior que o Salazar, e a desilusão total Olha, nem no tempo do Salazar. Que tristeza! e a ameaça que nunca cumpriu Este ano não vou votar. E dias correriam. Ao que nós chegámos... Dias longos e breves, dias de sol e de Inverno. Dias e meses e anos. Estão completamente loucos. Perderam as estribeiras. E teria refilado. Retorquido. Sugerido. Comentado. Apontado. Criticado. Reprovado. Mas hoje, hoje só houve silêncio.

3 comentários:

  1. Silêncio? E o que tu escreveste? Por ele, como se fosse ele. Nem pensar que há silêncio, enquanto tens tudo na tua cabeça e o partilhas conosco.

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  2. Teria sido assim com o meu Pai também, Leonor. «Ferveria» com o que se está a passar. De resto, foi sempre um homem muito crítico da política e dos políticos, qualquer política e quaisquer políticos.

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  3. Convosco nunca há silêncio. Penso muitas vezes como teria sido infinitamente mais triste se não tivesse tido sempre uma palavra vossa.
    Beijoquinha

    É que não teria havido um minuto de silêncio, Luísa. O meu pai seria incapaz de aceitar este governo que se diz socialista sem um imparável refilanço.

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