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segunda-feira, 3 de abril de 2006

Dispersos

Estava no aeroporto Charles de Gaulle, após dez horas de voo, quando comecei a tentar decifrar os títulos dos jornais em francês. Perdida nas subtilezas da língua e tendo em conta os meus parcos conhecimentos de francês, ainda oscilei perante a notícia. Uns títulos depois, e isto porque os nossos amigos franceses mesmo num aeroporto internacional pautam pela quase ausência de livros, periódicos ou revistas noutras línguas que não a francófona, percebi que o Papa João Paulo II tinha de facto morrido. Durante os últimos anos da doença de João Paulo II, o meu pai mostrava-se chocado e indignado, não tanto pela imagem de decadência progressiva mas, acima de tudo, pelo sofrimento notório e por achar que João Paulo II, como qualquer homem no ocaso da sua vida, devia ter o direito a morrer descansado e, por conseguinte, retirar-se da vida pública para em paz esperar pelo seu momento, recolher-se para aguardar em serenidade, longe dos holofotes do carpir colectivo e de algum voyeurismo perverso, a libertação do corpo a que a doença condenara. A grandeza dos homens não reside no desvelar da intimidade da sua dor.

1 comentário:

  1. Foi ele que quis assim, talvez para mostrar a todos os que sofrem que era um deles! Também às vezes me pareceu demais, não o quanto se expunha, mas o quanto sofreu. Como tantos. Com tantos.

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