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domingo, 20 de agosto de 2006

Lugares

Hoje de novo a mesa posta e o meu pai ausente. O lugar do meu pai ausente. O lugar ausente do meu pai. E eu de olhar estupefacto, quase acusador. E agora? Sim, e agora? O olhar inquisitivo e pesaroso entre a mesa e o H., paciente ao meu lado, quase aflito por aquela falta que subitamente deixara a descoberto por um prato a menos na mesa e os dois lado a lado, como sempre, lado a lado, ajudando-nos a resolver aquele vazio ainda, o lugar em branco e os pratos às voltas sobre a mesa como se de um jogo se tratasse. Um puzzle do qual falta uma peça, um puzzle incompleto até ao ocaso dos dias, o puzzle subitamente inacabado, e agora?, traído pela vida que o fez completo. Sim, e agora? E os pratos e talheres dançando sobre a alvura da toalha. Assim? Não, assim. Agora fica ali um espaço. Assim? Sim, assim fica bem. Há mortos que não param de doer.

11 comentários:

  1. é difícil comentar, não quero nem imaginar que um dia a minha vez vai chegar... um forte abraço!

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  2. Apesar de sentir que o meu pai não estava bem nunca imaginei que ele fosse tão cedo e às vezes ainda ando à procura do que me aconteceu, como foi que não o tenho já. Os acontecimentos precipitaram-se como uma avalanche.
    Não antecipes, pequete, aproveita bem :)
    Bjs

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  3. O melhor de conselhos possíveis que deste para Pequete. É simples: try to finish everyday as if it were YOUR last. Leave no 'unfinished business'.
    And if you have the chance to say at the end of every conversation, "I love you", that will leave you such a wonderful feeling. Leonor, look to your own heart; you know he is there. And because he is there, he is 'alive', but in that altered landscape you describe so well, so poignantly. I feel for you. You must allow yourself the strength and vision to look beyond. You know he would never have wanted you to live forever in this pain of grief. See him in his right place. He cannot be happy if you continue to suffer for him. He cannot suffer more, it is we who must live on who suffer with our losses. Only you can know when you are ready to gently let go, but never forget (which is impossible). Take strength from everything, everyone you have, including your Dad. For his spirit to rest in peace, it also takes your help.
    I can't make you believe in what I know,just trust me, hewants this,deservesthis, needsthis. it will bebetter, I promise! And Ana is sending you her Margarida in return for your Guidinha soon!

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  4. Dia 13 foi dia dos pais por aqui. Também senti esse lugar vazio...E era o dia do aniversário do Rogério. Vai-se levando, mas depois de todo esse tempo, já penso mesmo que não para nunca de doer.

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  5. Thank you so much for the considerate and touching words, Nowhereman. You are so right about my beloved dad. Every single day of my life I try to go through this pain without the dark side of it. I know he would never want me to suffer and I know, I felt it almost a year ago, that the time had come for him and that he was slowly drifting away peacefully. But sometimes it strikes me unexpectedly. Bjs grandes

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  6. Bjs grandes, Gláucia, estas ausências são mesmo irreparáveis. O tempo apazigua mas não cura.

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  7. Ainda está tudo tão recente que custa a levar o dia-a-dia como se não estivesse.Leva tempo até conseguirmos fazer o puzzle de novo, sem as peças que nos faltam.Acabaremos por conseguir mas parecerá sempre incompleto.
    Eu, que conheci bem o seu querido pai, lembro-o com tanta clareza, através de muitas memórias mas, sobretudo agora, através do que a N. deixa transparecer nos seus textos. Até a voz, o sorriso (lá debaixo do bigode :), a hospitalidade dele e o valor que dava à amizade, o geito dele... e vejo-o sempre com a sua mãe ao lado (gostei tanto de conversar com ela ontem!). Como vos deve fazer falta! Mas, como diz muito bem o comentador anterior,a seu tempo conseguirá 'gently let go'e guardará para sempre as memórias, tão doces, que dele tem.
    Um beijo muito amigo.
    Milucha

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  8. Fico comovida com as suas palavras, Milucha. É um conforto saber que nas minhas palavras encontra o meu pai. Todo este ano tenho tentado deixá-lo partir e lembrá-lo sempre com um sorriso por baixo das lágrimas mesmo que devesse ser ao contrário. Sei também que Alguém foi misericordioso com o seu fim, mas como diz, Milucha, há sempre a sensação do puzzle incompleto. Um beijo enorme

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  9. É impressionante a dificuldade em aceitarmos a realidade quando ela nos é hostil.

    Às vezes até nas coisas mais simples sai-me o desabafo "bolas, por que é que tu não estás cá? agora como é que eu trato disto?"

    Eles fazem falta, e vão fazer falta sempre. Mas o tempo que os tivémos ao nosso lado foi bom, mas tão bom...

    Um beijo grande

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  10. Ele não está ausente... só não o consegues ver... sei que não é o mesmo, querida L, e que não há consolo que esconda toda a tristeza. Mas estamos cá nós, para aquecer um bocadinho o vazio.
    Beijos grandes

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  11. Beijos grandes amiga e muita força.

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