Na Páscoa da minha infância na Beira Alta, algures numa encosta virada para o Dão, mora ainda a memória daquele Domingo de Páscoa. Cedo seria por certo, a idade permanece uma incógnita. Havia sol, as indumentárias deixavam inequívoca a solenidade aparente do momento, um ritual desconhecido que se adivinhava. Encontro-me numa casa cheia de adultos numa aldeia esquecida perto de Viseu, na sala austera perante a mesa posta com rigor carregada de doces, bolos, alguma fruta, a toalha alva, imaginada agora de linho. Esperava-se com algum alvoroço e, enquanto se esperava, a mesa permanecia inviolável aos olhos dos presentes, alvo da minha cobiça contida, porém. Assim permaneceu durante anos. A imagem da mesa, a espera interminável, o desejo de comiscar um ou outro bolo, de deitar a mão a um biscoito ali bem perto, o mistério da inviolabilidade da mesa. Mais tarde aparece o padre, dá o senhor a beijar, beijei-o também eu, o senhor, e depois foi-se, a mesa intocável e inatingível, algo que a minha percepção de criança não conseguiu nunca digerir. De seguida, uma comezaina ali perto num barracão que albergava muita gente. O padre, esquecido do pecado da gula, derrubava-se sem pudor sobre o opíparo almoço de Páscoa. Terá havido leite-creme e pão-de-ló com queijo da Serra, as estórias são um cozinhado ao qual se vão adicionando ingredientes na busca da perfeição, mas a mesa ficará para sempre intacta e alva, os bolos coloridos e decorados, as laranjas expectantes e o meu pai sempre comigo nesse tempo perpetuado pela memória.
E eu que agora fiquei com uma vontade de pão de ló com queijo....
ResponderEliminarPois ontem fiz um e saiu pessimamente :(
ResponderEliminarEmocionas-me. Também senti saudades do meu pai nesta páscoa.
ResponderEliminarUm beijo grande.
Sempre que regresso de algum lado tenho ainda mais suadades.
ResponderEliminarBeijos grandes