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sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Tende piedade de mim

Num dia de aflição recorri ao cabeleireiro da aldeia. O cabeleireiro da aldeia é como quase todos os cabeleireiros, com a diferença de que é da aldeia e na aldeia, sendo menos os habitantes do que na cidade, é tranquilo e sossegado, frequentado com mais clientela em dias de festa e de missa.
No dia em que fui ao cabeleireiro da aldeia tive uma revelação que mudou a minha vida: pela primeira vez em longos anos de existência capilar abundante tive alguém que não refilou do meu cabelo, não me deixou com um lado mais comprido do que outro, não me afogou a trunfa em produtos milagrosos contra os males de que todas as mulheres sofrem assim que põem pé nesses altares de sacerdotisas dos bigodis, já não há, eu sei, mas dá-me jeito aqui na escrita e gosto da palavra bigodis. As magas das mises, as papisas do brushing não perdem uma oportunidade para comercializar a sua mercadoria mágica, capaz de operar maravilhas, milagres capazes de amedrontar o Vaticano. Eu própria testemunhei a epifania destas práticas poderosas quando um dia as madeixas vermelhas desbotaram na primeira lavagem ou no dia em que indo pôr uma tinta no cabelo me deixaram com uma tarja negra na testa que me obrigou ao recolhimento durante dias ou ainda no dia em que a cabeleireira me deixou o cabelo bem mais curto do que havia desejado e pedido. Este episódio teve sequelas naturalmente, varias temporadas com vários episódios e, qual Sansão, fiquei diminuída e infeliz.
No dia em que fui ao cabeleireiro da aldeia a minha vida mudou. Fui recebida com o falar doce de um mineiro que, ao contrário de me arremessar com considerandos vários sobre a dificuldade de manusear a cabeleira, alardear soros, espumas e outros produtos viscosos de última geração, deitou mãos ao trabalho e fez aquilo que sempre desejei: cortou-me o cabelo de forma eficiente e profissional.
Cansado, porém, dos penteados dominicais, o cabeleireiro decidiu abandonar o beatame e fez-se à vida para lá da aldeia não sem antes avisar a clientela fiel, eu incluída, naturalmente. Passou a atender em casa, sem luxos, assim me avisou no primeiro dia que lá fui Olha, não tenho luxo para te oferecer, só o meu trabalho, que já se sabe é logo meio caminho andado para o coração, sou rapariga muito sensível a gente genuína e continuei a ser cliente assídua. Há técnicas de fidelização irresistíveis.
E agora o problema: o meu cabeleireiro encontra-se ausente. Meu deus, tende piedade desta descabelada infeliz, voltará? Estou com uma trunfa que mais pareço o Peter Frampton, temo transformar-me no Kenny G, a continuar assim ainda vou parecer o vocalista dos Europe, e sem ele, o meu rico cabeleireiro, o que farei? Ó deus, tende piedade de mim.

9 comentários:

  1. Querida Leonor o que posso eu sugerir, pergunto-me .. um carrapito enquanto ?! (risos)

    Que humor :)
    Beijinho e bom fim-de-semana

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  2. Não podemos viver sem o nosso cabeleireiro, é verdade.
    Mas não me parece que corras o risco de ficar com o vocalista dos Europe, vá! És pelo menos muito mais gira ;o)

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  3. Voltei! Um bocado careca mas já resolvi o assunto e, entretanto, já cacei outro post ;-)

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  4. LOL.

    Eu não tenho esse problema, felizmente: de 5 irmãos, sou a única que tem um cabelo domável em casa... só vou ao cabeleireiro cortar e pintar, e mesmo assim é raro. Como não tenho cabelos brancos (yupi!), resta o corte... e até isso já fiz em casa!

    beijo

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  5. Mas eu também só vou para cortar, a última vez que me arranjaram o cabelo foi há sete anos :-)

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  6. Oh, Leonor, por que torturas te fizeram já passar.
    Dou-te o contacto da minha Daisy e nunca mais vais deixar mais ninguém aproximar a tesoura das tuas orelhas!

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  7. (rebolo de tanto rir)
    Leonor, se dependesse de mim, para além de pedir a Deus que não tivesse piedade de si, arranjava maneira do seu cabeleireiro sumir.
    Tenho que lhe agradecer este bom momento, apesar dos meus mais novos me olharem de soslaio por causa de tanta risota.

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  8. Também tenho de lhe agradecer vivamente este «post», Leonor, porque, além de me ter feito rir, como ao Mike, me deu a enorme satisfação de constatar que não sou só eu a sofrer horrores em cabeleireiros. :-)

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  9. Ainda bem que se riram, mas a minha vida com as cabeleleireiras não é nada fácil.
    Estou um bocadinho mais careca mas já tenho outra história para contar :-)

    Beijinhos aos três

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