Dezembro. Pelas frestas da portada chuviscam-se-me gotículas de sol como feixes dourados, entrevejo a luminosidade, pressinto a manhã perfumada de sol e bela como apenas os dias de sol são. Agradeço veneranda, a quem saber-se-á jamais, a bênção de dias soalheiros em pleno Dezembro. E deixo que o Dezembro presente varra todos os passados, cinzentos, húmidos, frios. Dias breves sem sol. Faço-me à estrada deixando para trás tudo, a escola, os alunos, um período inteiro de aulas e trabalho, cansaço, exaustão. Faço-me à estrada e organizo mentalmente ao que vou. Natal. Presentes. E faço-me à vida como gosto, estrada fora, preocupações ausentes. Mentalmente sem papel ou lápis refaço listas, escrevo textos que deito janela fora se se me tornam inconvenientes ou metediços. Os textos são assim. Reescrevo outros, a frase, é sempre a primeira frase que me chama quando me lanço estrada fora. E já perdi muitas primeiras frases e muitos textos. Há textos que só se deixam apanhar pelas primeiras frases, como um fio numa meada de lã, encontrar sempre a ponta do fio, sem ela o novelo tornar-se-á num enriço, uma amálgama de fios desordenados, sem princípio nem fim. Perco-os por isso. Mentalmente distribuo presentes. E chego ao lugar com calma, a calma de um dia de sol belo, os dias de sol são menos tristes se sol houver. E faço compras. Telefonemas. Livros para a criançada não sem antes confirmar E o Ruca, têm o Ruca no Natal? Não? E sigo, ando por entre estantes e escaparates, gente com pressa, filhos, família. E confirmo a lista. Está tudo. Recolho a lista e regressa-me a culpa E o Papá? Está tudo não. Desta vez não foi o lugar vazio. Foram os presentes que não te comprei.
Deliciosamente rabiscado por Leonor. Para mim é mais simples, contudo e paradoxalmente, mais doloroso. Na família e entre amigos (poucos mas bons) só há prendas para as crianças há muitos anos. Para os adultos há beijos e abraços. E no dia 26 sou um homem novo. Mas o mais importante foi dito no primeiro parágrafo. :-)
ResponderEliminarFeliz Natal Leonor, para si a para todos aí em casa.
..assim como há textos que só se deixam apanhar pelas primeiras frases..talvez existam também prendas que só se deixam apanhar pelo que não se compra nunca...e talvez sejam essas mesmas as melhores..não? :)
ResponderEliminarEste texto tem a ver com os espaços vazios e a ausência, não tanto com o valor dos presentes, esses têm o valor que lhes quisermos dar. O que me é sempre difícil é contar ou ter de não contar com o meu pai.
ResponderEliminarBeijinhos aos dois :-)