A cusca era uma mulher pelos seus sessenta anos, rotunda e de penugem farta sobre o lábio superior que catava no fim-de-semana na cabeleireira da aldeia, altura em que aparecia com as sobrancelhas depiladas em arco e as superfícies agora dadas ao ar avermelhadas pelo calor da cera. A cusca não se chamava cusca, a cusca chamava-se um outro nome. A cusca passeava a barriga proeminente rua acima e rua abaixo, durante a semana passeava também a bata de trabalho sempre com as mãos nos bolsos e os sentidos despertos não fosse acontecer algo na sua vizinhança.
A cusca tinha um filho, único, tão rotundo como ela, sem as mamas achatadas sobre a pança, mas igualmente tisnado do sol que padecia de solteirice aguda, o que sendo tão parecido com a cusca senhora sua mãe não era de estranhar. E parecido que ele era, o mesmo olhar ensimesmado e desconfiado, a denúncia inequívoca da sua origem, as sobrancelhas a tocarem-se. Azar tivera. Caso fosse parecido com o pai mudar-se-lhe-ia a sorte, porque não sendo a beldade das beldades, era um homem jeitoso para os padrões. A cusca chorava e chorava-se muito e sofria muito com este mal do seu filho, tantas casas e um carro tão bom e solteiro, tanto sofria, que, quando um dia lhe bateram à porta para a convidarem para um casamento, debulhou-se em lágrimas e aos ais, que não, que não podia ir, ai que desgosto, meu rico filho, que só ia a casamentos quando o seu menino se casasse.
A cusca era carinhosamente apelidada de cusca porque nutria um especial interesse por tudo o que dizia respeito à vida alheia e, na sua condição de cusca, efabulava amiúde para justificar as falhas nas narrativas urdidas em conversas dispersas. Certo dia a cusca bateu à porta da inquilina. Era Domingo à tarde e a inquilina detestava Domingos à tarde e de Inverno para agravar a situação. A inquilina pensou Vem cá vem, vem cá vem, que vais ver como elas te mordem… A inquilina deixou a cusca aproximar-se de mansinho e quando ela estava aos salamaleques, boas tardes e outros fait-divers, a inquilina resolveu pôr em pratos limpos os boatos que lhe haviam chegado
Havia uns meses que a casa da cusca se enchera de manchas amarelas que mais pareciam um quadro de Miró, humidade entranhada nas paredes que se soltara com o calor da lareira, razão lógica para qualquer mortal. Não sendo a cusca qualquer mortal, não havia razão que maculasse as suas ricas casas, excepto uma utilização medieval da sua querida lareira. Era ela a inquilina que andava a assar chouriços na lareira.
A inquilina chegou-se à porta, por esta altura, ia eriçada e furibunda, e atira à cusca Ora ainda bem que aí vem. Então diga-me lá. Anda para aí a dizer que eu asso chouriços na lareira? A cusca ruborizou, escandalizada e aflautou a voz Eu? Eu a dizer uma coisa dessas? A inquilina não lhas poupou. Uma ensaboadela bem passada que deixou a cusca em estado calamitoso de choraminguice. Que não, que não tinha dito nada, que as pessoas é que eram maldosas e que isto e que aquilo e foi-se afastando-se aos Ora vejam lá, diz uma pessoa uma coisa, abanicando a saia domingueira até ao portão que deixou criteriosamente fechado. E depois desse dia não mais vi a cusca.
A cusca tinha um filho, único, tão rotundo como ela, sem as mamas achatadas sobre a pança, mas igualmente tisnado do sol que padecia de solteirice aguda, o que sendo tão parecido com a cusca senhora sua mãe não era de estranhar. E parecido que ele era, o mesmo olhar ensimesmado e desconfiado, a denúncia inequívoca da sua origem, as sobrancelhas a tocarem-se. Azar tivera. Caso fosse parecido com o pai mudar-se-lhe-ia a sorte, porque não sendo a beldade das beldades, era um homem jeitoso para os padrões. A cusca chorava e chorava-se muito e sofria muito com este mal do seu filho, tantas casas e um carro tão bom e solteiro, tanto sofria, que, quando um dia lhe bateram à porta para a convidarem para um casamento, debulhou-se em lágrimas e aos ais, que não, que não podia ir, ai que desgosto, meu rico filho, que só ia a casamentos quando o seu menino se casasse.
A cusca era carinhosamente apelidada de cusca porque nutria um especial interesse por tudo o que dizia respeito à vida alheia e, na sua condição de cusca, efabulava amiúde para justificar as falhas nas narrativas urdidas em conversas dispersas. Certo dia a cusca bateu à porta da inquilina. Era Domingo à tarde e a inquilina detestava Domingos à tarde e de Inverno para agravar a situação. A inquilina pensou Vem cá vem, vem cá vem, que vais ver como elas te mordem… A inquilina deixou a cusca aproximar-se de mansinho e quando ela estava aos salamaleques, boas tardes e outros fait-divers, a inquilina resolveu pôr em pratos limpos os boatos que lhe haviam chegado
Havia uns meses que a casa da cusca se enchera de manchas amarelas que mais pareciam um quadro de Miró, humidade entranhada nas paredes que se soltara com o calor da lareira, razão lógica para qualquer mortal. Não sendo a cusca qualquer mortal, não havia razão que maculasse as suas ricas casas, excepto uma utilização medieval da sua querida lareira. Era ela a inquilina que andava a assar chouriços na lareira.
A inquilina chegou-se à porta, por esta altura, ia eriçada e furibunda, e atira à cusca Ora ainda bem que aí vem. Então diga-me lá. Anda para aí a dizer que eu asso chouriços na lareira? A cusca ruborizou, escandalizada e aflautou a voz Eu? Eu a dizer uma coisa dessas? A inquilina não lhas poupou. Uma ensaboadela bem passada que deixou a cusca em estado calamitoso de choraminguice. Que não, que não tinha dito nada, que as pessoas é que eram maldosas e que isto e que aquilo e foi-se afastando-se aos Ora vejam lá, diz uma pessoa uma coisa, abanicando a saia domingueira até ao portão que deixou criteriosamente fechado. E depois desse dia não mais vi a cusca.
Já uma pessoa não pode assar chouriços à lareira, hein? Ora toma lá sua cusca, para aprenderes a não meteres o nariz em lareira... hum... alugada? (risos)
ResponderEliminarEra alugada, felizmente já passaram seis anos sobre este episódio :-)
ResponderEliminarTenho de confessar, por outro lado, que é uma pena já não ser alugada. A cusca dava uma excelente fonte de inspiração!
ResponderEliminarSinto que não existe aqui o devido distanciamento... cheira-me a chouriço assado!
ResponderEliminarCoitada da cusca.
E que foi feito do filho da cusca?
ResponderEliminarME
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ResponderEliminar... ó pá ... desiludida que fiquei por não poder deixar aqui uma brincadeira anónima!
Com cuscos king size eles cobiçavam era o chouriço assado :)
ResponderEliminarÓ Carlota, dizes isso porque não conheces a cusca... :)
ResponderEliminarPobre de mim que tive de a aturar, António ;-)
Maria Emília, seria assunto para outro post ;-)
Pois é Sinapse, é que detesto anónimos... :-)
Viagens, nunca se sabe... ;-)
Obrigada a todos pelos comentários :-)
Se eu tivesse uma lareira haveria de lá assar chouriços.
ResponderEliminarDizes isso porque não tens, Isabela ;-)
ResponderEliminarE umas morcelas? E marshmallows! Ah, isso é que era! :o)
ResponderEliminarLOL
ResponderEliminarSerá que a cusca casou com o Tibúrcio?? :-)
ResponderEliminarLOL
ResponderEliminarMas olha que se conheciam... Como é que advinhaste, Ana? :D
Parecem-me feitos um para o outro... ;-)
ResponderEliminarAdivinhaste, claro está :-)
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