
Na aldeia, um sentido proibido é um sentido proibido, regra respeitada sem discussões ou transgressões conhecidas mas um estacionamento proibido nem sempre é estacionamento proibido. Há dias em que é proibido, outros em que as riscas amarelas servem apenas o propósito de quebrar a monotonia do asfalto acinzentado e outros ainda que são cabalmente ignorados, tão ignorados que se lhes estaciona por cima. Nos dias em que anda à roda a clientela da tabacaria espraia-se tabacaria afora, nesses dias o estacionamento proibido não é estacionamento proibido, a sorte pode ser uma urgência, nos dias em que há missa é maioritariamente ignorado e nos dias em que há velórios na igreja idem. Razões de monta evidentemente. Contudo, em dias de muita chuva ou muito sol os estacionamentos proibidos observam o mesmo lastro de permissividade. Se chove não há tempo para delongas e se está sol para quê ter tanta pressa.
Para viver na aldeia é preciso largar à porta os espartilhos da condução orientada pelo tempo limite de deslocação entre um ponto e outro. Atestei-o quando num dia passado me fiz à aldeia vinda da cidade, envolta num furioso incandescente de semáforos e passadeiras. Movida a frenesi urbano e ainda com o fumo dos escapes presente na pituitária, ousei entrar irrequieta na ruela estreita para desembocar na igreja. À minha frente um carro branco pausado e lento. Sem aviso prévio parou na faixa de rodagem e condutor e transeunte encetaram o que parecia ser uma conversa amistosa, o sol de fim de tarde convidava à cavaqueira inconsequente. Exasperei de impaciência, refilei de incompreensão e enraiveci de intolerância. Tudo isto sozinha no meu carro, enquanto a conversa continuava absolutamente alheia e indiferente ao meu desesperar colérico e, quando terminaram, fui ainda simpaticamente cumprimentada pelo condutor sorridente. Melhor do que qualquer livro de auto-ajuda a aldeia convida a um dos ensinamentos que tenho como válidos para os dias de correria desvairada: há que saber parar.
Esta crónica escrita para o PNETMulher foi inspirada pelo Mestre José Franco que se me atravessou no caminho num dia de correria desenfreada. Repesquei-a hoje no dia em partiu e deixou a aldeia mais pobre.
Há sim, senhora, Leonor. Há que saber parar... mas também é preciso saber tanta coisa para saber quando parar...
ResponderEliminarEstá tudo ligado :-)
ResponderEliminarRefere-se ao José Franco, oleiro do Sobreiro?
ResponderEliminarExactamente, James
ResponderEliminarLindo...
ResponderEliminarObrigada e bem-vinda
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