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quarta-feira, 21 de abril de 2010

Estudos Blogosféricos

Ao dar umas voltas por aí sem destino, e por aí entenda-se blogosfera e Facebook, descobri um sítio onde se oferece um curso sobre como criar um blogue de sucesso. Ensinam-se coisas muitíssimo úteis como, por exemplo, criar um blogue, links, conteúdos e imagens e a relação com os comentadores. Tudo isto em quatro horas e 36 euros. Tendo em conta a experiência no ramo, proponho-me a criar uma licenciatura, curso de 1º ciclo de Bolonha, com várias cadeiras semestrais como, por exemplo, Noções básicas de blogar I: como treinar o seu blogue para a vida na blogosfera, Noções básicas de blogar II: barras laterais e links, diz-me quem linkas, dir-te-ei quem és, Noções básicas de blogar III: quando o blogue ganha vida própria, Noções básicas de blogar IV: como sobreviver ao seu próprio blogue; Comentadores I: eufemismos elementares, Comentadores II: gestão da fúria para comentadores impulsivos, Comentadores III: gestão da fúria para bloggers impulsivos, Comentadores IV: lições de português elementar para comentadores analfabrutos; Tipologia de blogues I: política e sociedade, o meu Francisco Louçã é mais giro que a tua Manuela Ferreira Leite, Tipologia de blogues II, blogue meu, blogue meu, há alguém mais belo do que eu?- o blogue enquanto exercício narcísico masturbatório, Tipologia de blogues III, blogues no feminino: sapatos, depilações e dietas, Tipologia de blogues IV, quando os homens blogam e os estrogénios rebolam, por exemplo. Bem gerido ainda dava uma pós-gradução de Bolonha, 3º ciclo.


segunda-feira, 19 de abril de 2010

Vida interrompida

Do lado de cima das ribas avistava-se a praia cheia. Surfistas com as pranchas, adolescentes espalhados no areal em meia-lua, atentos com os olhos posto no mar. Um mar imenso e relativamente calmo, um vento vindo do oceano azul empurrava o cabelo como se a vista se tornasse cada vez mais límpida, mais clara, até à linha do horizonte. E cá em cima como lá em baixo, a espera. Flores em coroa partem primeiro, depois todos eles, homens e mulheres da minha idade, com quem cresci e passei os momentos loucos de risadas no pátio do liceu e noites de boémia com muito álcool e pouco juízo, e jovens, alunos e alunas habitualmente sentados à minha frente, outros com quem me cruzo diária ou esporadicamente pelos espaços da escola. E depois de feitos ao mar, um cordão humano que surgiu espontaneamente, mãos que procuram mãos, o silêncio apenas cortado pelo rebentar das ondas deste dia claro, o bordejar de almas doridas e inconsoláveis no areal. A roda que se forma no mar pelos amigos, os pais, os irmãos, o fato de surf mais eloquente que qualquer outro trajar, as pranchas como velas que embalam almas, os corpos embalados pelas ondas agrestes do mar batido, e tecem a homenagem mais singela e sentida. Uma roda desenhada no mar. As flores ao centro. Uma salva de palmas que ecoa forte e ritmada. E depois descer ao areal e confortar a minha colega de escola com palavras nenhumas, a mãe a quem amputaram o filho, apenas os olhos que falaram, palavras trocadas à toa, as minhas alunas que se me abraçaram com o salgadiço que apenas o mar da Ericeira tem, a maresia agarrada nos beijos impotentes que lhes dei, o colo incapaz de sarar a dor ou parar os soluços. Nunca ninguém devia sofrer assim. Nunca ninguém devia sofrer.
Tinha dezassete anos, saiu de casa para testar a mota e não voltou. Morrer assim devia ser proibido.