O mesmo dia, o mesmo mês, o mesmo ano. Apenas umas escassas duas horas, de acordo com o que li na Praça da Canção, separam o meu pai de Manuel Alegre quanto à chegada a este mundo, sendo o poeta mais novo. O meu pai tinha um certo orgulho por esta coincidência. Hoje depois de ler O Quadrado fui à procura da obra do poeta. Encontrei isto:
Trinta Dinheiros
No bengaleiro do mercado público
penduraram o coração.
Vestem o fato dos domingos facéis.
Não têm rosto
têm sorrisos muitos sorrisos
aprendidos no espelho da própria podridão.
Têm palavras como sanguessugas.
Curvam-se muito.
As mãos parecem prostitutas.
Alma não têm. Penduraram a alma.
Por fora parecem homens.
Custam apenas trinta dinheiros.
in Obra Poética
Porque será que me parece tão actual?
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