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domingo, 2 de outubro de 2005

Sofá vazio

Na véspera, o Hélder disse que iria ele ver o meu pai. A minha mãe anuiu e eu concordei. Quando regressou, vinha tenso e pálido, com o rosto cerrado e disse baixinho, quase inaudível, julgo mesmo que nós as duas, baixitas e expectantes, lhe pedimos que repetisse o que dissera. Soltou então, como um sopro, como eu julgo ter partido o meu querido pai, "Faleceu" e repetiu "Já faleceu". Abraçámo-nos os três e chorámos ali mesmo, no átrio do hospital, baixinho, abraçados sempre como se um fôssemos. E depois, vieram os amigos, a igreja e as flores, e depois, deixámos-te, Papá, junto da Vóvó, naquele sítio onde ainda só uma vez fui, e depois vieram dias e noites e mais dias. Dias há em que penso ainda que irei encontrar-te de sorriso aberto, sentado no teu sofá de eleição, esperando-nos ansioso, pela hora do almoço, refilando com uma notícia da televisão ou presenteando-me com uma peça de fruta, escolhida com o teu carinho único, "Toma, escolhi para ti". A casa tornou-se enorme sem ti e o sofá continua vazio.

6 comentários:

  1. Na tua cabeça e no teu coração, o sofá estará sempre ocupado...
    Mil beijos!

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  2. os meus olhos encheram se de lágrimas... senti neste post aquilo que sinto e não consigo descrever ao entrar em casa do meu pai e não conseguir encara la sem a minha mae, que faleceu vai fazer 3 anos somente com 50 anos acabador de fazer.. mas acredita no nosso coração eles estrão sempre no sitio deles.

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  3. Querida Papalagui
    Ainda nao te tinha escrito nem abracado antes, porque nao sabia como, porque nao tinha como, porque percebo muito bem a tua dor, e nunca sei bem como cada pessoa reage a palavras que sempre bem intencionadas, a nos as vezes, no meio do turbilhao, nos parecem vas!
    Beijos e abracos apertados, muitos!

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  4. Muito obrigada! As palavras nunca são vãs se são bem intencionadas, querida Patrícia. Já antes tinha pensado fazer um blogue, mas agora senti necessidade de partilhar estas memórias e de certa forma homenagear o meu querido pai. Beijinhos a todas e obrigada pela vossa visita.

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  5. ;(( não consegui evitar as lágrimas... a minha relação com o meu pai é muito distante e fria, e muitas vezes hostil. mas sei que é isto que eu vou sentir quando o meu avô morrer... e ele já está tão velhinho... :(

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  6. Leonor, é chocante, ler um ano mais tarde a dor que sentias. It cut my breath. For a moment, the time was all confused, until I saw '2005'.
    When a cut is so deep, it takes very little, despite the passing of time, to open it up again. Doesn't it? It is probably because we bleed so much in the first place. Can you possibly imagine how it might be if you couldn't even see the sofa anymore? I could tell you how it feels, but only for me.
    This is a phenomenon in whichthe concept fo 'solution' cannot possibly apply. There is only the future.
    With many warm wishes, as ever.

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