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quarta-feira, 31 de maio de 2006

Volta Chewbacca!

Primeiro começou a fazer uns ruídos peculiares. O H. disse Acho que temos o Chewbacca na cozinha. Os grunhidos eram irregulares, ora mais intensos, ora como um lamento. De vez em quando desapareciam de todo. Isto era quando pensávamos que o Chewbacca se tinha ausentado e, como não era propriamente agradável pensar que uma criatura assim habitava a nossa cozinha, esses momentos de silêncio deixavam-nos particularmente felizes, acima de tudo, porque quando o Chewbacca ia passear, o nosso frigorífico, agora pomposamente chamado combi, voltava ao normal e exercia com competência a função para o qual tinha sido adquirido há uns meros cinco anos. As nossas noites continham pois estes diálogos preciosos em torno da existência da dita criatura Hélder, o Chewbacca voltou outra vez, isto ao mínimo barulho, Hélder, hoje não ouço o Chewbacca, quando o dito dormia na paz dos anjos. De repente, o Chewbacca não voltou mais e com ele desapareceu o gorgulhar característico do frigorífico, os roncos e grunhidos. Na verdade, foi ficando tão tímido, tão silencioso, mas tão silencioso que no Sábado se ficou como um passarinho, bateu a bota, esticou o pernil. Finou-se precisamente num dia de calor intenso, de canícula sufocante. Sentido de oportunidade não se pode dizer que lhe falte. Desde então que vivemos à míngua de coisa alguma que necessite de refrigeração, o que nos dias que correm é quase tudo. Tentámos de imediato ressuscitá-lo, depois provocá-lo e, por fim, insultá-lo sem piedade, o que depois do repertório com que fui brindada na praia no dia anterior não se me apresentou como tarefa difícil. Tudo em vão. Findas todas as tentativas, estivemos à beira de cometer um acto tresloucado de violência electrodoméstica e espetar-lhe com uns pontapés na barriga e umas cuspidelas nos olhos, mas depois como os professores vão ser avaliados por seres da mais variada espécie ainda por determinar, temi que o frigorífico se voltasse contra mim e me espetasse com um Insuficiente na sua apreciação final, o que vindo de um frigorífico pode ser grave e temível. Evito até ir à cozinha, que sou fraquinha dos nervos e nem o posso ver, impassível e indiferente, como se nada se tivesse passado e, hoje em dia, com o que aí vem, convém esbanjar simpatia até para um sapo, não vá ser sobrinho do filho da cunhada da prima do avô da tia da avó do primo do pai e da mãe do aluno. Ao menos que tivesse ido com o Chewbacca, escusava agora de ter aquele monstro de aço pespegado na cozinha a rir-se na minha cara.

7 comentários:

  1. Acabei de chegar a uma conclusão irrefutável: não é apenas que eu goste de ler os teus textos, nem apenas que goste de vir aqui. É que sou tua fã. Fã, na inteireza do significado.
    Morri de rir ao ler. Tenho a impressão de que podes fazer rir ou chorar com qualquer desculpa. Bjs

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  2. LOL! Só tu para fazeres um texto destes, e com esta piada, sobre o fim de um frigorífico..... :o)

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  3. E já agora... eu cá n sou nem d elonge relacionada com algum dos teus alunos, por isso podes desabafar à vontade, que n te dou má nota.

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  4. Que responsabilidade enorme e que honra as tuas palavras, Gláucia. Nem sempre consigo escrever e já apaguei sonho de fazer da escrita algo mais do que o blogue ou o que escrevo para a gaveta, mas há alturas em que os texto vão aparecendo e escrevo muito de cabeça, enquanto faço outras coisas. Bjs a todas

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  5. Syrin,
    Eu estou quase como o outro Quantos são? Quantos são?. Não fico assustada com a participação dos E. E. na nossa avaliação, preocupa-me mais a humilhação a que estamos sujeitos e com outras questões da carreira. Mas obrigada pelo apoio ;-)
    Bjs

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  6. Esta é a descrição mais linda, que alguma vez li, sobre um frigorifico a finar-se!!!! ehehehehehe

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