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terça-feira, 1 de agosto de 2006

Pedaços de Mar

Afastei-me suavemente da sala no terminus de mais uma aula, acompanhada desta feita por dois jovens futuros professores. Era 6ª feira. Com o fim da aula deu-se início a mais um fim-de-semana e a descontracção instalou-se ao ritmo a que os livros eram arrumados, como a semana, agora lentamente lá para trás. A conversa recaiu sobre as terras natais dos meus alunos, sitas no Portugal insular. Pois é, professora, a Madeira está muito diferente! E eu Pois, pois, já lá estive há alguns anos… O outro, mais sereno e tranquilo, um pouco mais alto e pausado, olhava-me através dos óculos com um olhar algo pueril ainda. Questionou A professora conhece os Açores? Respondi negativamente e lamentei o desconhecimento do arquipélago, sabendo agora que um dia vindouro encetarei uma peregrinação de afectos, homenageando um dos locais preferidos do meu pai, homenageando-o a ele, ao meu querido pai. O coração é um peregrino errante. Não, ainda não, José. Mas ouvi dizer que é lindíssimo… E o Zé continuou por trás dos óculos Ai tem que lá ir, professora! E a tudo lhes disse que sim, acompanhado por um gesticular afirmativo e consentâneo, enquanto a alma se me resvalava desobediente, se me escapava veloz, para a iguaria das iguarias, e a voz dos curiosos mestres em embrião, jovens e entusiásticos, afastava-se ficando apenas um eco suave, um borbulhar de sons em surdina, tudo longe e distante, cada vez mais longe e cada vez mais distante.
Encontrei-me de novo na tasca, feita restaurante, da mais bela e serena praia deste nosso canto luso, a mais longa e resplandecente, tranquila como uma língua dourada num perpétuo beijo com o Atlântico. Voltei a sentir a brisa suave do estio porto-santense a afagar o cabelo revolto enquanto pelo nariz se elevava o cheiro amanteigado e marinho com um toque amargo e cítrico dos univalves ainda a crepitar na chapa, observando, pela porta escancarada para os mares, o dia a esconder-se e o oceano azul a beijar a areia dourada. De novo os perfumes marítimos e a água a crescer na boca pela percepção dos pedacitos de mar em concha à minha frente sobre a mesa grosseiramente posta, sem cuidados nem requintes. Na comunhão intensa dos sentidos são dispensadas toalhas imaculadas ou baixelas preciosas. E a natureza foi una com os sons pacificadores do mar sereno e a tranquilidade cromática do crepúsculo, comigo ali mais uma vez, de novo ali, com o mar a marulhar contra a areia e o sol a recolher-se nos seus braços. Pois, professora, um dia que vá aos Açores, já sabe… ao que retorqui Muito obrigada, José! estremunhada pelo cutucar da voz dele nos meus ouvidos, acabada de chegar lá de longe, onde os sonhos se embalam.

13 comentários:

  1. Com que gosto acompanhei este seu regresso em memória ao Porto Santo!
    Bjo

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  2. Beijos grandes! Adoro o Porto Santo, não desfazendo da Madeira e que saudades tenho de umas lapas a crepitar naquele molhinho... Em lado nenhum são tão boas. Bjs

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  3. A minha viagem de sonho é um périplo pelas 9 ilhas dos Açores. Só conheço duas, e são tão lindas, tão lindas...

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  4. Ora pois Porto Santo, Madeira, Açores...tenho por estes locais rodeados de mar uma ligação sentimental tão profunda que ao recorda-los sinto a temperatura amena das pessoas e a encosta Madeirense coloridamente cheirosa... palavras que se tornam a espuma das águas que as cercam, pois são todas muito lindas...
    R.

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  5. Há algum tempo vi na TV brasileira um documentário sobre os Açores e a sua ligação com o Brasil. Na metade do século 18 o governo português incentivou a imigração de casais açorianos para ocupar o extremo sul do Brasil, para marcar posição contra os vizinhos espanhóis. Conheço algumas cidades litorâneas de Santa Catarina que sofreram grande influência dos Açores, herdando deles o seu sotaque. Aqui em São Paulo os pais de uma amigo já me carregaram um par de vezes para bacalhoadas no Clube dos Açorianos, com direito a danças e músicas.
    E pelo que vi na TV o arquipélago é belíssimo. Quem sabe um dia...

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  6. Dado que sou do contra, e quem me conhece já nem me reconhece se não for, cá venho discordar ;)
    Já fui aos Açores uma vez, talvez há uns 14 anos?? (velha! velha!) e à Madeira 3 vezes. Não gostei por aí além dos Açores, tem uma ou outra particularidade interessante - a ilha do Pico (infelizmente não subi ao topo), as furnas, a Lagoa das Sete Cidades, o vulcão dos capelinhos... mas depressa me cansei de hortenses, vacas e verde. Pronto, não faz o meu "género", que se há-de fazer? Gosto muito mais da Madeira, numa só ilha tem tanta diversidade, e surpreende-nos ao virar de cada esquina. Porto Santo tem boa praia, e pronto :)
    E as espetadas da Madeira, o bolo do caco e o bolo de mel?! Nham!

    (agora vou-me embora sossegadita para não me baterem muito... :P)

    (L., consegui finalmente pôr fotos no blog! já não mudo de casa, lol)

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  7. Que mistura curiosa, o sotaque brasileiro com o açoriano. Nem consigo imaginar, uma vez que a descontração do brasileiro me parece a antítese do açoriano. Também gostava muito de visitar os Açores mas acho as viagens caras.

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  8. A gastronomia da Madeira é excelente!!!!

    Ainda bem que o Blogger cedeu, o malvado. Algures em Junho passei pelo mesmo, mas o importante é que já não vais embora.

    Quanto a um destino para ti atrevo-me a sugerir Nova Iorque...

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  9. Sugeres bem! Aos anos que lá quero ir, agora ando a chatear mais o P. mas o desgraçado arranja sempre uma desculpa diferente e nunca mais... :(

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  10. Desculpas??? É tão giro Nova Iorque!!! Se eu pudesse viajar fora das férias escolares, aproveitava uma dessas tarifas aéreas baratinhas e ainda ia outra vez, mas vendo bem ainda há muito mundo para ver ;-)

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  11. Dos Açores, só conheço S.Miguel. E achei lindo, lindo, lindo.

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  12. Eu conheço S. Miguel, Terceira e Pico. Achei lindo o que vi e fiquei com muito boas recordações dos Açores. Adorava ir às Flores, e a S. Maria.
    À Madeira infelizmente nunca fui, mas hei-de ir lá também!

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