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segunda-feira, 25 de setembro de 2006

Das grandes invenções

Quando um dia chegar a minha hora e o barqueiro me levar para o outro lado do rio, por favor, ponham-me post-its no bolso. É que sem post-its não sou ninguém e nunca se sabe o que vou encontrar na outra margem. Cá em casa há de todas as cores e tamanhos, portanto. Aqui, mesmo ao meu lado direito, ao alcance da mão, uma pilha de coloridos, quadrangulares, para as eventualidades, no estojo que carrego comigo para a escola uns menores e mesmo na mesa-de-cabeceira não faltam dos transparentes mais estreitos para assinalar passagens nas leituras nocturnas antes de me abandonar nos braços de Morfeu. Este meu gosto é também partilhado pela minha mãe, muito embora ela seja bem mais selectiva e a sua preferência recaia sobre os estreitos transparentes. Um destes dias de consumismo, ela fez uma descoberta que irá mudar a sua relação com os guias de viagem e com o próprio viajar em si: um marcador transparente com um porta post-its incorporado. Desde já um instrumento tão útil como a máquina fotográfica, imprescindível como o passaporte, indispensável como a escova de dentes, e que não poderá faltar em viagem alguma doravante.
A minha mãe é uma amante indefectível de livros. Ama-os, respeita-os, acarinha-os, ouve-os, lê-os, estou certa que falará mesmo com eles e as páginas se reescreverão neste diálogo. Com ela e com o meu pai aprendi este respeito e veneração. O meu pai não entendia sequer por que havia de se estragar o livro com o nome do seu proprietário, cioso da integridade dos livros. Com ele aprendi a nunca mas nunca escrever a tinta nos livros, a não dobrar as páginas para marcar a leitura, a virar as páginas, folheando-as suavemente pelo canto superior e a tacteá-las docemente para não ferir o papel. Assim se foram transmitindo os mandamentos de manuseamento de livros, e mesmo não os respeitando na íntegra, uma vez que gosto de escrever o meu nome nos meus livros, tenho-os sempre comigo, muito embora o H. me acuse, a espaços, de os maltratar particularmente quando os vê escachados sem pudor exibindo as entranhas para o scanner.
A minha mãe é seguidora destes mesmos princípios, excepto no que diz respeito aos guias de viagem. Não que os trate mal, não que lhes escreva a esferográfica, não que lhes dobre os cantos ou cometa outras heresias mas a quantidade de sublinhados a marcador transparente para assinalar o que quer ver, o que viu, como e quando viu, porque viu e o que ainda falta ver, assim como a panóplia de post-its coloridos que descaem levemente das páginas na horizontal e se eriçam do topo das mesmas na vertical tornam os seus guias em verdadeiros espectáculos de luz e cor. Antes de irmos de férias entreguei-lhe um dos meus guias, de forma a que fosse seguindo o itinerário. A minha mãe é uma respeitadora inflexível e intransigente da propriedade alheia, jamais deixaria um traço em livro que não fosse seu ou tocaria em algo que não lhe pertencesse. Disse-lhe na pressa da partida Toma, é para ti! Sem explicações nem delongas. Quando cheguei o guia já era outro. Os locais por onde deambulámos entre caipirinhas e coqueiros reluziam ufanos e o guia, mesmo em casa, tinha viajado pelas mãos intrépidas e mente curiosa da minha querida mãe. Ao ver o meu olhar, respondeu tranquila tu disseste-me Toma, é para ti! Ripostei É para ti ver, não para ti escrever. Ela riu-se como sempre e eu com ela como sempre. Foi isto antes do marcador maravilha, nem imagino como irá ser depois.

7 comentários:

  1. :o)))

    Acredito que deve ter sido uma "emoção"!!! ehehehheh
    Um beijo enorme para ti, espero que estejas bem!

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  2. Sempre me ensinaram de pequenina ( em minha casa a leitura era um imperativo) que o livro é um amigo e por isso deve ser tratado com carinho... e assim foi sempre e continua a ser. Nem quero pensar se me visse despojada dos livros que me rodeiam, nas salas, no corredor e até no hall... Nos livros de estudo habituei-me a escrever a lápis bem afiadinho e n.º 1, que é o mais macio... Agora com os marcadores transparentes e de várias cores e os post-it ... é a loucura! Mas mais nos guias turísticos... Faz parte da viagem; é o antes, o agora e o depois. É quase como visitar duas vezes o mesmo sítio... Embora concorde com o Poeta, deixem-me parafrasear livremente - ai que prazer ter um guia para ler e para marcar tudo o que quero ver!...
    Um beijo

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  3. Esse marcador tem muito bom aspecto, e eu que também não sou de escrever nos livros!
    De resto acho excelente a ideia da tua mãe, e os guias de viagem devem ficar muito melhores assim, com mais cor, vividos, apreciados, transformados em parte de nós :) E fartei-me de rir com a história :op

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  4. Mas que ideia gira! Eu também gosto de post-its e acho que vou ficar fã deste produto.
    Beijos (para ti e para a tua mãe)

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  5. Olá Elsa!!! Bem-vinda.

    Eu compreendo bem a minha mãe porque os meus guias também têm alguns post-its, fantasminha, mas ela consegue redecorá-los. Bjs

    Não és a única, Pitucha, ainda hoje uma colega me perguntou onde os podia comprar. Beijocas também :)

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  6. Gosto muito de ler a mãe, através do 'local'da filha.Bjos às duas pelos talentos de escrita respectivos.Se pudesse, punha post-its aqui n'A Curva da Estrada'.

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  7. Obrigada, Milucha. Acho que o blogue is ficar bem divertido cheio de post-its :)

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