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segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Chiado, Tejo e tudo (3)


Lisboa que desfila

Enquanto peço uma bica sentada n’ A Brasileira ocorrem-me as linhas de António Lobo Antunes. O escritor íntimo de Lisboa declara o seu ódio aos semáforos “a principal razão que me leva odiar os semáforos é porque de cada vez que paro me surgem no vidro da janela criaturas inverosímeis: vendedores de jornais, vendedores de pensos rápidos, as senhoras virtuosas com uma caixa de metal ao peito que nos colam autoritariamente sobre o coração o caranguejo do Cancro”. Embora me encontre tranquilamente sentada com a estátua corcovada do poeta Chiado à minha frente, longe de semáforos, a abordagem imediata, mal me havia sentado, de um homem reclamando uma contribuição para os doentes com SIDA, retornou-me as palavras do escritor. Dou-lhe uns trocos para que me deixe em paz, pouco convicta da sua sinceridade, ele esboça uma expressão insatisfeita. Nos dias que correm também Lisboa se rendeu a uma procissão de personagens características, em nada comparável ao sucedido décadas antes. Esta não é a Lisboa de António Lobo Antunes mais uma vez, um desfile de “microencefálicos, macroencefálicos, coxos, marrecos, estrábicos divergentes e convergentes, bócios, braços mirrados, mãos com seis dedos, mãos sem dedo nenhum, mongolóides, dirigentes políticos, etc.”, mas é suficientemente incomodativa, contudo. O Chiado também é feito disto.


(continua)

5 comentários:

  1. Leonor, estou a acompanhar com muito interesse a reportagem. É um gosto reconhecer Lisboa nas suas palavras e nas suas fotografias (apesar do desgosto que é enfrentar certas realidades). :-)

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  2. É mesmo um desgosto, Luísa. A propósito desta reportagem e desta passagem, lembrei-me muito da Lisboa dos anos 70 que guardo na memória. Era um desfile de desgraças: aleijados, cegos e deficientes. Felizmente já não é assim tanto mas às vezes parece que estamos a regressar. Obrigada pelas suas palavras :)

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  3. Esta Lisboa que eu amo
    Nesta Lisboa que eu amo
    Vejo o mar a cada esquina
    Esta Lisboa tem ondas
    No andar de uma varina

    Cidade tão antiga, cidade amiga,
    Modesta e bela,
    Varia com as marés
    e tem o Tejo a seus pés a chorar de amor por ela

    Cidade de mil cantigas
    Nasce a canção como a flor
    Na boca das raparigas
    Andam cantigas de amor

    Cidade tão antiga, cidade amiga,
    Modesta e bela,
    Varia com as marés
    e tem o Tejo a seus pés a chorar de amor por ela

    Ai a chorar de amor por ela…
    :))

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  4. A Ana é poeta. ;D
    Mas esta reportagem da Leonor puxa ao sentimento. ;) ... para quem tem uma enorme paixão por Lisboa, que não é meu caso. :/

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  5. Tenho uma paixao muito grande por Lisboa...Ainda ontem a lágrima quase me saltou do olho... Há vinte anos que não andava no cacilheiro...e ontem atravessei o Tejo no velhinho cacilheiro...e ver Lisboa do meio do Tejo, foi algo que me emocionou...

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