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segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Como os gatos


Entrou em casa com o ar aflito de sempre, os olhos de misericórdia que nos levaram à certa quando já tínhamos decidido que duas gatas era lotação esgotada nesta casa, miou com a voz de sempre, de menina desamparada à procura de protecção, e depois de ter bebido água e comido um biscoito, decidiu que hoje havia de mudar de poiso. Que não se pensasse que ficaria para sempre confinada ao espaço de quase reclusão que escolheu quando a Julieta aqui chegou e começou a ter focinho empinado. Durante a manhã já havia prometido e em vez do canto reservado do olhar de todos, um verdadeiro abrigo contra intrusos e outros chatos, optou pelo sofá. Agora mesmo está ali sentada num cadeirão encostada à gata mãe que apesar de muito refilona tem paciência. Há sítios mais cómodos, mas nenhum lhe pareceu tão apetecível como aquele, encostada à mãe, negociando mais um pedaço da almofada laranja, conquistando território. E é isso que gosto nos gatos. A inconstância após longos períodos de hábitos instalados, a mudança inesperada, exactamente na medida dos seus humores repentinos, Agora já não quero isto, uma existência verdadeiramente livre dos constrangimentos do social, Não, não vou ronronar, dos embaraços das ofensas bacocas Desculpa lá não me ter sentado ao teu lado, Desculpa lá hoje apetecer-me outra coisa. Esta forma tão própria de ser, de não querer saber e afirmar-se em tudo. A inveja de também eu sentada no sofá poder entregar-me ao pecado sem culpa de ser apenas eu. Como os gatos.

Lolita e Guidinha

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