As preocupações fora de portas e nada
mais há naqueles instantes É como se o mundo parasse. Momentos de puro prazer,
deleite, escapismo. O mundo seria mais fácil se tudo se reduzisse ao prazer
ancestral de matar fomes e desejos e tudo se pudesse resolver à mesa entre
aromas e palatos saciados. Pela janela há um dia de Dezembro bem claro, o sol
que brilhou pela manhã apaziguando o crepúsculo de algo que se não sabe muito
bem o que é, o mundo como o conhecemos talvez, algumas seguranças e garantias
colapsam como baralho de cartas sem que nada se possa fazer se não aguentar. A
roda da fortuna que cumpre o seu destino. Aguentar dias, anos, de verborreia moralista
de crime e castigo, pecados alheios que agora temos de pagar. Não quero saber.
Não agora. Não hoje. Deixo amolecer 250 gramas de margarina enquanto deito 125
gramas de açúcar mascavado na velha taça azul que me acompanha há anos nestes
momentos de descontracção. Lá fora entardece mansinho. Um cão que refila, o
mesmo de todos os dias feriado e fins-de-semana e uma das gatas espreita-me
pela porta da cozinha. Bato energicamente o açúcar e a margarina até ficar um creme fofo e junto-lhe
225 gramas de farinha. Dezembro é mês de cozinha, de colo e de regresso, a
casa, a nós mesmos, ao fim para que o início regresse. Envolvo bem a farinha e
junto-lhe 100 gramas de flocos de aveia. E depois vario. Não há receita nas
minhas mãos que não seja acrescentada, mudada, experimentada com umas pitadas
imprevistas ao sabor dos meus dias e vontades, imprevisíveis também. Meia tablete de chocolate
culinário cortada grosseiramente, pedaços irregulares a quem vou sem critério cortando mais aparas pontiagudas para envolver na massa. E esperar. Uma hora de frio. Uma hora de silêncios tranquilos, o bálsamo necessário deste Dezembro que me traz agastada. Bolachas tendidas com o carinho de quem alimenta e de quem ama. O amor também se alimenta da alquimia de aromas e metamorfoses. E depois
há o perfume do forno quente e do chocolate espalhando-se pela casa. Entardece. Recolho-me
num biscoito e um chá aromático. Se tudo pudesse reduzir-se a prazeres simples.
Às vezes pode. Hoje pôde.
A receita dos biscoitos foi inspirada nesta. Um beijo à Cristina Nobre Soares a quem prometi experimentar as bolachas de aveia.
A receita dos biscoitos foi inspirada nesta. Um beijo à Cristina Nobre Soares a quem prometi experimentar as bolachas de aveia.
Agora sou eu quem tem de experimentar esta receita ;). E esta parece-me uma excelente história.
ResponderEliminarExperimente que ficam bem, mas o mérito é da sua receita. Deliciosa :)
ResponderEliminarComo eu te entendo... E que belo texto.
ResponderEliminarObrigada, blonde. Às vezes acho que era capaz de ser feliz só assim. Assim ou a ter uma livraria ou a trabalhar em flores, uma panca que me surgiu quando estive em Keukenhof, na Holanda.
ResponderEliminarQue receita tão bem contada :)
ResponderEliminarNada como experimentar, Ilídia :)
ResponderEliminarNo tag 'do palato para a alma' estão outras.
Sim, sim, eu percebo bem este conceito de cozinhar ...
ResponderEliminarÉ, não é Ivone :)
ResponderEliminarSou um bocado intempestiva mas tenho esta faceta de acarinhar alimentando. Só os mais chegados a conhecem. Adoro cozinhar para as pessoas e ter gente de que gosto à minha mesa. Um prazer imenso.
A melhor receita de sempre, transporta-nos para aquele cantinho da infância cheio de cheiros e memórias. Lindo, Leonor.
ResponderEliminarBêjos
:))
Bêjos, Loca :))))
ResponderEliminarObrigada.
"ou a ter uma livraria"...já somos duas!
ResponderEliminar~CC~
Ps. E cheira aqui a chocolate!
Vamos sonhando, cc :)
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