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segunda-feira, 10 de julho de 2006

Peroradelas

Ontem enquanto acabava de pôr a mesa para o almoço, o H. se via a braços com as entremeadas na brasa e as gatas andavam rapioqueiras no jardim aproveitando o sol, a Selecção chegou ao aeroporto da Portela.
Já se sabe que nestas coisas do futebol me fico pela rama e tenho tendência para reparar apenas naquilo que me salta a olho nu e lá vão saltando algumas coisas. Desconheço passes, cortes e sei-lá-mais–o-quê, sei que o Ricardo é guarda-redes e pouco mais. Nada entendo de técnicas e tácticas. Assim sendo, quando o avião, albergando os nossos rapazes na barriga, aterrou na Portela e à medida que a máquina aparentemente em estado pós-coital ia abrandando na pista, reparei que a dita ostentava o nome da poetisa de amores trágicos, verbalizações exaltadas e ardores inflamados: Florbela Espanca.
A poetisa com Eros a espreitar entre os seus versos, a dormir sob as suas rimas e a despertar sobre os seus sonetos pareceu-me uma belíssima embaixatriz para os corpos atléticos e elegantes da esquadra lusa, exsudando testosterona e virilidade perante a luz do zénite lisboeta. Já se sabe que a mente é uma rapariga muito matreira e pouco obediente e, portanto, nem a imaginei a socorrer-se de um dos seus sonetos para dar as boas-vindas aos nossos rapazes, até porque os rapazes da bola não creio que algum dia tenham passado os olhos pelos versos da poetisa ou o entoar do seu canto lhes tenha passado pelo canal auditivo. Imagine-se se soltasse Minha alma ardente é uma fogueira acesa,/ É um brasido enorme a crepitar! Alguém responderia Tá aqui uma gaja a dizer que tá a arder e o Figo diria Logicamente mediante a escaldante temperatura exterior. Ouvi-a antes segredando-lhes aos ouvidos os versos de Almeida Garrett Não te amo, quero-te (…) Ai, não te amo, não; e só te quero /De um querer bruto e fero. É sabido que os homens não entendem meias palavras, nem sempre são muito entendidos em metáforas femininas e nada como a eloquência e frontalidade das palavras masculinas para uma rapariga se fazer entender.

5 comentários:

  1. Estou mesmo a ver:
    - Dou-te o meu corpo prometido à morte!
    - Não, dona, é engano. Eu sou o Deco, o Boa Morte é aquele ali...

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  2. Pois estás cheia de razão.
    E aqueles homens em especial só entendiam se o poema fosse o seguinte (e dito aos berros!):
    Portugal!
    Portugal!
    Campeões!
    Campeões!
    Fica!
    Fica!

    :)
    Beijola.

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