Quando Marcel Duchamp se lembrou de usar um urinol e transformá-lo em obra de arte, o mundo reagiu estarrecido e dividiu-se entre ofendidos e seguidores, ultrajados e admiradores, injuriados e idólatras e assim se foi prosseguindo por esse mundo fora. Joseph Beuys também era um rapaz dado a metamorfose dos objectos do quotidiano em obras de arte e Warhol é o exemplo acabado do que pode acontecer a um mera lata de sopa, que lá andava tranquila na sua vidinha. Nada contra. Mas o que me encanita, enfurece e revolta é a quantidade de artistas anónimos que povoam este Portugal de lés a lés e, porque não têm nomes nem amigos, estão votados ao abandono, esquecimento e anonimato, quiçá, morrerão numa valeta entre o betão e a brita. Aqui à porta, por exemplo, assisto a estas manifestações artísticas amiúde.
Tudo começou quando bem à porta de casa me foi plantada uma betoneira em adiantado estado de decomposição, pobrezita, uns buracos aqui e ali, as marcas do cimento e da massa, testemunho indelével das horas infindas de laboração. Nessa altura era fácil indicar aos amigos e visitantes a casa de onde vos teclo estes episódios da vida quotidiana, ao entrarem na rua, a casa é que tem à frente uma betoneira. Assim foi durante uns meses. Depois veio cá o engenheiro, como se sabe os engenheiros não são dados à arte, e ao olhar para o objecto vetusto estrategicamente colocado à porta de casa, viu uma betoneira a cair de velha. Sacou do telemóvel, contactou o autor e, sem qualquer sensibilidade, ordenou a retirada imediata do statement of art. Derramei uma lágrima por trás dos cortinados, enquanto a betoneira era arrastada e afastada para sempre. Tinha ganho afecto ao objecto que de intruso passara a ser decorativo e jamais voltaria a fazer tão boa figura perante os convidados familiarizados com estes meandros e princípios da criação artística.
A partir de então passei a ter de indicar a minha casa pelo número da porta, como o mais comum dos cidadãos, o que neste momento deixou de ter validade, porque agora tenho plantado no jardim um carrinho de mão caduco. Está encostado ao muro, é certo, mais discreto do que a betoneira, mas também tem o seu charme e sempre quebra a monotonia, mas essa, já havia sido quebrada com a cobertura do cerâmico do terraço quando lhe foi sobreposta uma camada espessa de uma gosma elástica, aplicada como o dripping de Pollock mas de uma cor só. E isto é que encanita: tanto artista neste país e porque são apenas Zés ou Maneis pagarão o resto da vida pela sua falta de berço, enquanto semeiam arte nos lares lusos. Não há justiça neste mundo.
Tudo começou quando bem à porta de casa me foi plantada uma betoneira em adiantado estado de decomposição, pobrezita, uns buracos aqui e ali, as marcas do cimento e da massa, testemunho indelével das horas infindas de laboração. Nessa altura era fácil indicar aos amigos e visitantes a casa de onde vos teclo estes episódios da vida quotidiana, ao entrarem na rua, a casa é que tem à frente uma betoneira. Assim foi durante uns meses. Depois veio cá o engenheiro, como se sabe os engenheiros não são dados à arte, e ao olhar para o objecto vetusto estrategicamente colocado à porta de casa, viu uma betoneira a cair de velha. Sacou do telemóvel, contactou o autor e, sem qualquer sensibilidade, ordenou a retirada imediata do statement of art. Derramei uma lágrima por trás dos cortinados, enquanto a betoneira era arrastada e afastada para sempre. Tinha ganho afecto ao objecto que de intruso passara a ser decorativo e jamais voltaria a fazer tão boa figura perante os convidados familiarizados com estes meandros e princípios da criação artística.
A partir de então passei a ter de indicar a minha casa pelo número da porta, como o mais comum dos cidadãos, o que neste momento deixou de ter validade, porque agora tenho plantado no jardim um carrinho de mão caduco. Está encostado ao muro, é certo, mais discreto do que a betoneira, mas também tem o seu charme e sempre quebra a monotonia, mas essa, já havia sido quebrada com a cobertura do cerâmico do terraço quando lhe foi sobreposta uma camada espessa de uma gosma elástica, aplicada como o dripping de Pollock mas de uma cor só. E isto é que encanita: tanto artista neste país e porque são apenas Zés ou Maneis pagarão o resto da vida pela sua falta de berço, enquanto semeiam arte nos lares lusos. Não há justiça neste mundo.
imagem: minha
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Volta betoneira, voltaaaaaa!
ResponderEliminar:)
Ai não! ;-)
ResponderEliminarBem, posso sempre pedir aos engenheiros que depois dos longos meses do Metro se dedicam agora a arranjar a minha rua na baixa do Porto para, quando acabarem, entrarem em contacto contigo. Posso dar-lhes o link para o teu blog, posso, posso?
ResponderEliminarIsto, claro, se eu aguentar a falta que me vão fazer a partir das 8 da manhã, quando ando por cá...
Adorei o post. Obrigado.
:)
LOL
ResponderEliminarJá recuperei da betoneira, é melhor não lhes dar o contacto que é para eu não me magoar mais ;-)
De nada.
Este mundo é injusto....
ResponderEliminar;)