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segunda-feira, 14 de abril de 2008

A dinossáuria

A fotografia marcou a vez primeira em que me vi outra. Num miradouro altaneiro em Graz, na Áustria, há uma década mal medida, nada faria prever que, uns dois meses depois, olhasse para o momento eternizado num rectângulo brilhante e reparasse naquela ao lado da minha colega de profissão. As duas sorrindo, uma conhecida, era ela, a minha colega, a outra parecia eu. O mesmo olhar e o sorriso meio tímido ou cansado, cansado sim, lembro-me agora: aquele não havia sido um dos tempos mais fáceis da minha existência de mulher. Era eu. Havia algo indefinível na expressão. Não que fossem rugas ou o pescoço mais marcado, não era o rosto mais longilíneo. Era algo indizível na aura da imagem, meio crepuscular mesmo com a luz da tarde a iluminar a cidade que servia de pano de fundo à fotografia e assim, sem tanto procurar, o dizer é bem mais imediato que a escrita destas palavras, disse-me e vi-me irredutivelmente velha. E depois vieram episódios vários: passei a ser tratada por senhora, assim vindo do nada, como daquela vez em que num consultório médico, a mãe advertiu a filha Não incomodes a senhora!, ou como num dia em que ao cumprimentar a filha de uma colega, ela me respondeu Olá, senhora! Assim mesmo, sem nome, senhora apenas. O dia em que me sentei em frente ao médico que já não via há anos largos e que ao perscrutar-me com o olhar retorquiu implacável Eu lembro-me de si… Não era assim, não deixou margem para qualquer dúvida naturalmente. Nem o médico, nem quando um dia da semana passada uma aluna se abeirou de mim. Trazia um tom comprometido na voz Stora? O indício inequívoco de que algo aí viria, talvez uma pergunta pessoal, quem sabe. Ó Stora, insistiu, Sim… respondi. E a pergunta veio A Stora… a stora é do tempo dos discos de vinil? E não é que era mesmo?! A stora, eu dinossáuria, eu mesma, euzinha era do tempo do vinil. Se isto não é chamar velha a uma pessoa não sei o que será então.

7 comentários:

  1. Oh! :)
    Não é preciso exagerar, Leonor. Dinossáuria?
    Mas sei do que falas. Sinto isso quando vejo os olhos com que os amiguinhos do Migas olham para mim quando ainda me lembro tão bem de ontem ser da idade deles...

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  2. Junta-se outra dinossáuria, então...
    Às vezes sinto-me mesmo velha!
    Beijos duma velhota para outra :o)

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  3. Percebo-te, mas fico sempre a pensar que são eles que estão a perder, os novinhos;) Num curso que acabei agora, 2 dos meus colegas tinham 20 anos e acharam estranho eu ter cassetes de audio em casa...

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  4. Bem, eu ainda escutei muitos discos de 78 rpm e de 45 rpm...
    Mas agora tenho um iPod!

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  5. Obrigada a tod@ pelos comentários. A situação acabou por ser engraçada mas só queria que vissem a cara da garota... parecia mesmo uma coisa do outro mundo.
    Beijos

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  6. Uma vez, um aluno disse-me que devia ter sido o máximo ter sido adolescente nos anos 80... e eu disse que sim senhor, que tinha sido. E foi mesmo!

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