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sexta-feira, 30 de maio de 2008
quinta-feira, 29 de maio de 2008
Tricotando estórias
Dou voltas à escrita como a um novelo colorido à procura do fio primeiro. A textura macia da lã apertada ao meio com uma cinta. Libertemo-la da cinta, não há escrita que resista apertada e procuremos o fio, a ponta do fio a partir da qual se dará forma pelo entrelaçar criterioso dos fios, de um fio, sempre o mesmo que amaranhando por si próprio e rodopiando ao ritmo da escrita ganhará a consistência de que são feitas as estórias.
terça-feira, 27 de maio de 2008
Terça-feira (4)
segunda-feira, 26 de maio de 2008
sábado, 24 de maio de 2008
Maio sonhado
Despertar com os raios de sol forte a espreitarem-me pelas frestas das portadas. Acordar estremunhada pelos feixes de luz e levantar-me apressada, detesto perder um dia de sol, o duche rápido, pelo corpo ainda húmido um vestido leve que escorregue como carícia, os pés livres e desimpedidos, as havaianas, indefectíveis, imprescindíveis, indispensáveis nos momentos de abandono ao lazer, ao prazer de nada pensar e muito pouco ser. O pequeno-almoço tranquilo, não demasiado dolente, o sol espera-me lá fora. Saio, chinelo pelo jardim fora nas havaianas coloridas, os melros fogem, penduram-se como trapezistas no canavial, a relva como um tapete fofo acamado pelos passos despreocupados sem destino definido, uma festa ao cão do vizinho, Cãozinho lindo, és o meu cãozinho também, dia sem festa canina não é dia, as gatas que buscam refúgio na exuberância do maçaroco, dará mais este ano?, flores que despontam, o hibisco laranja vai dar flor, as hidrângeas regressam outra vez lilases, aniladas, azuladas, é do ferro, dizem-me, que abandonaram os tons rosáceos em definitivo, confiro a passiflora, entrelaça-se ardente, as flores libertam um perfume perfeito para esta manhã de Maio sonhada.
quinta-feira, 22 de maio de 2008
de A a Z
Abnegada, activa, altruísta, amável, amada, amiga, apaixonada, aventureira, bem-disposta, bem-humorada, bibliófila, carinhosa, compreensiva, conversadora, convicta, companheira, crítica, curiosa, dedicada, descontraída, desenrascada, desempenada, destemida, determinada, devotada, directa, disponível, divertida, enérgica, espontânea, exigente, faladora, fantástica, forte, generosa, genuína, hospitaleira, incansável, inconformada, independente, infatigável, informada, ingénua, inigualável, inteligente, interessada, intrépida, irrequieta, íntegra, jovem, jovial, justa, leal, leitora, líder, livre, luminosa, lutadora, mãe, mulher, notável, obstinada, ouvinte, perseverante, positiva, professora, querida, recta, refilona, respeitada, respeitadora, rija, risonha, sábia, sensível, sincera, sonhadora, sorridente, teimosa, transparente, única, viajante, voluntariosa, zeladora, zelosa.
Parabéns, Mamã!
terça-feira, 20 de maio de 2008
Terça-feira (3)
As comemorações dos cinquenta anos da Bossa Nova começaram antes da efeméride redonda que este ano se celebra no Brasil.
E, para saber onde, como, quando e porquê, nada como dar uma saltadinha ao PNETmulher.
E, para saber onde, como, quando e porquê, nada como dar uma saltadinha ao PNETmulher.
segunda-feira, 19 de maio de 2008
Momento sitemeter (8)
Anda uma cidadã pacatamente na sua vida, descansando no período sabático em que os ginecologistas, os médicos mais cuscos e intrometidos que se conhece, se ocupam de outras criaturas que têm, desde já, toda a minha solidariedade e compaixão, quando, de repente, alguém se lembra de vir perguntar por torturas medievais. Agora que a visão de me tornar numa prateleira para o giz era apenas uma névoa distante, tornou-se numa ameaça presente. O que o sitemeter pode fazer às pessoas.
domingo, 18 de maio de 2008
Zélia Gattai
Eu te darei um pente
para te pentear
Colar para teus ombros enfeitar
Rede para te embalar
O céu e o mar eu vou te dar...
para te pentear
Colar para teus ombros enfeitar
Rede para te embalar
O céu e o mar eu vou te dar...
Jorge Amado
Acreditemos que Zélia Gattai foi ao encontro do seu Jorge Amado.
Imagem daqui
sábado, 17 de maio de 2008
E os leitores?
A Feira do Livro de Lisboa vai ser adiada na impossibilidade das partes em litígio de chegarem a um acordo. Esta trica assemelha-se ao caso Esmeralda, em que cada um pensa em si e a criança, coitada, anda lá pelo meio ou uma desavença de comadres, cada uma lutando por um pedaço de terra a mais para plantar as couves e as batatas no quintal. Não me interessa quem tem razão, o meu disco rígido não comporta ditos e mexericos, intrigas e manobras. Sendo questionáveis os moldes como a Feira era organizada e disposta e urgindo uma remodelação mais adequada, de forma a dar mais vida ao evento, uma coisa eu sei, e falo apenas como leitora, afinal qual é o papel dos leitores no meio de tanta disputa? A Feira do Livro acompanha-me desde sempre e também ela terá forjado o meu gosto pela leitura. Remonta aos primórdios da minha existência, quando ir à Feira, ainda pela mão dos meus pais, constituía um ponto alto do fim da Primavera e me era dada a autonomia para poder escolher os livros do meu agrado. Razões de coração obviamente. Por isso também sinto-me desrespeitada. A Leya, a Apel e a Câmara Municipal de Lisboa zelam afinal pelos interesses de quem? Devia ser pelos dos leitores, ao que parece, esses serão os últimos a ser contemplados. Ainda não ouvi falar deles. Este ano, não irei à Feira do Livro.
Também no Geração Rasca e PNETmulher
sexta-feira, 16 de maio de 2008
quarta-feira, 14 de maio de 2008
A utilidade das pegas de cozinha
terça-feira, 13 de maio de 2008
Terça-feira (2)
Chego a casa e procuro furiosamente. Na sala, no quarto, em todos os locais por onde os livros se espraiam, mas nada. Nadinha. Zero. Nicles. Népia.
E para saber o que procuro nada como passar pelo PNETmulher.
E para saber o que procuro nada como passar pelo PNETmulher.
segunda-feira, 12 de maio de 2008
O beijo preso no coração
E hoje, ter-te-ia ligado pela manhã, meu pai, não muito cedo já se sabe, eu e tu partilhamos o mesmo despertar ensonado, o acordar apenas após o café, e ter-te–ia dito Parabéns, Papá! Responder-me-ias do outro lado Obrigado, filhota, na voz sempre a indizível alegria e o carinho de me receberes em mais este dia. Mais tarde entrar-me-ias pelo portão. Primeiro tu, depois a Mamã. Provavelmente estaria na cozinha, quem sabe de avental ainda, preparando algo do teu agrado, o amor não é servido em restaurantes impessoais, e tu entrarias o portão, não antes de fazer uma festa à cadela do vizinho, olharias para o azevinho do lado esquerdo, se soubesses como está lindo, e admirarias como se dá bem neste canto do jardim. Iria ao teu encontro, dar-te-ia um beijo grande, um abraço apertado, repetiria Parabéns, Papá, ficarias babado e feliz com a tua filhota e dir-me-ias de novo Obrigado, filhota! E depois, os presentes singelos e a teu gosto, o amor posto sobre a mesa nos mais pequenos pormenores, e assim passaríamos o dia. E assim deveríamos passar o dia de hoje, meu pai, que não sei que ordem natural das coisas é essa, essa que dizem ser natural, essa que hoje me faz escrever este texto que nunca lerás e ficar com o beijo preso no coração. Assim é que devia ser: tu a entrares-me pela porta e eu a dizer-te Parabéns, Papá!
domingo, 11 de maio de 2008
Escrever uma história
Escrever uma história é como guiar um carro novo num país desconhecido, sem mapa, ao anoitecer. Mete a mudança, segunda, terceira, acelera, quarta, reduz, cuidado que a curva é apertada, a berma derrapa, animais atravessam, vem carro em contramão, e agora estás perdido, no último cruzamento foi má escolha, que é da estrada principal, atenção já aqui estiveste nesta árvore, é onde acaba ou começa o caminho, pára, marcha atrás, inverte o sentido, segue as marcas dos pneus, acelera outra vez. E lembra-te, se te despistares contra um muro, fá-lo com estilo.
Rui Cardoso Martins, "Fora de Mão", "Pública", 11.05.08
sexta-feira, 9 de maio de 2008
Avaliação contínua
Ser professor é estar em estado de alerta permanente. Uma vigília escrupulosa que não se compadece com estados ensonados, gripais, adoentados ou cansaço acumulado, não interessa se do ano, do mês, da semana, do período ou do dia. Olhos bem abertos, ouvidos em sentido, reflexos rápidos, sentidos apurados e coração aberto para melhor se ouvir o inaudível que passa entre olhares e sorrisos ou que se oculta neles. Um gesto, uma forma de estar, a expressão do olhar revelam mais do que verbalizações mil e, caso lhes seja dada oportunidade, retribuem com igual atenção, o que, se, por um lado, pode encerrar um carinho velado e um consolo ternurento, por outro, obriga a uma vigília redobrada. Um dia é o casaco, no outro a túnica, depois o anel, tudo perscrutado com rigor, de que ano é o Swatch skin que acompanha grande parte dos meus dias, onde fui nos feriados ou fins-de-semana, por exemplo, e depois, surgem aquelas perguntas acompanhadas da cumplicidade de alguém que sabe que está a ir longe demais ou a ultrapassar a barreira da privacidade, mas que a curiosidade não consegue calar, às vezes, também a necessidade de um conselho ou opinião. A pergunta de hoje não cabe na categorização anterior. Depois de terem assistido a uma palestra, os meus alunos entraram bem-dispostos e ruidosos como sempre e, enquanto se arrumavam e uma escrevia a data e sumário no quadro, a pergunta saiu certeira, o ar inquiridor acompanhando-a Stora? Que dia é hoje? Hoje? Retorqui Hoje, dia 9 de Maio? Hoje é Dia da Europa. A minha aluna redondinha e sorridente exclamou satisfeita Muito bem, stora! Prova superada.
O homem e a cidade
O homem não inventou a cidade; a cidade é que criou o homem e os seus costumes.
Guillermo Cabrera Infante
A frase paira no confronto com a urbe. O homem ou a cidade, quem criou quem? Uma questão que se me põe quando, de cachecol e luvas, atravesso a cidade quase despida, uns farrapos de neve sobre o casaco negro, o frio cortante como nunca antes se sentiu. Dor. O frio dói, e, contudo, é bela a cidade. E a frase volta quando ziguezagueando desemboco no Canal Grande e ouço o vociferar dos gondoleiros na manhã ensolarada. Está sol e o sol não dói. A cidade não dói. Quem te criou assim, cidade? Ouço-a de novo no miradouro de Santa Luzia, o casario como um tapete bordado até ao Tejo, palavras de poeta amancebadas com a cidade lá em baixo. Foste tu, poeta, que criaste esta cidade que ouço? E regressa sempre a frase, eterno enigma, que resolvo na tela colorida. Aquela não é a cidade. Não a que vi. Outra cidade, vibrante, um turbilhão cromático, e bela, igualmente sedutora. Foi o homem que inventou aquela cidade.
A convite da Dobra do Grito, escrevi este post que também pode ser lido aqui. Foi um prazer ser provocada e responder a mais este desafio.
quinta-feira, 8 de maio de 2008
Confissões
Hoje fiz algo pouco em voga nos anos oitenta, muito comum nos anos noventa e absolutamente inusitado no século XXI para os meus alunos: comprei um CD. Mas vindo de um professor, que mais se pode esperar?
terça-feira, 6 de maio de 2008
Momento sitemeter (7)
Marquise de cavaco silva? Procurou marquise de Cavaco Silva? Caramba, quase me tinha esquecido desse belíssimo momento de tuguice pura, protagonizado pelo Presidente da República e a sua presidenta. Resta saber se tão ilustre marquise não terá sido projectada pelo engenheiro Sócrates. É certo que não fica por cima dum curral, deus nos livre de tal em Campo de Ourique, mas pelas linhas, até parece ter mão do ilustre engenheiro. E para que não fiquemos assim, recordemos pois a Marquise em Campo de Ourique.
Como hoje é terça-feira
segunda-feira, 5 de maio de 2008
Paragens novas
Certeiro
To get back my youth I would do anything in the world, except take exercise, get up early, or be respectable.
Oscar Wilde
Oscar Wilde
sábado, 3 de maio de 2008
quinta-feira, 1 de maio de 2008
Filha babada
Mãe e filha concordaram. O vestido preto ficaria em casa para a ocasião e aquela de que não se pode dizer o nome, cruzes canhoto, mesmo que já tivesse desaparecido do estendal, não veria dia tão solene, onde andará tal bicho. Mãe e filha puseram pés ao caminho. Mãe e filha escolheram uma roupinha elegante e sóbria. Mãe e filha estavam em uníssono. Nada de cores estridentes nem padrões exuberantes. A mãe foi ao cabeleireiro. A filha amanhou a trunfa em casa. A filha foi buscar a mãe. Os vizinhos da filha olharam-na quando saiu de casa, surpreendidos com o aprumo para um dia de feriado municipal. Onde iria assim vestida? O genro pôs gravata e vestiu fato. Onde iria tão garboso? A filha ainda deu uma ajeitada na mãe. A mãe não precisava de ajeitadela alguma. Manias da filha, já se vê. Em dia grande de grande homenagem, a mãe irradiava a felicidade e grandeza dos quarenta anos na arte de ensinar todos e bem receber qualquer um no regaço generoso. A ajeitadela desnecessária como chapéu de chuva em dia de estio. Qualquer roupa teria ficado bem. Quando a alma refulge são dispensáveis ornamentos. Mãe e filha chegaram mesmo em cima da hora. A mãe havia de sentar-se na segunda fila, com a filha ao lado com o genro ao lado, demais convidados um pouco atrás. A filha estava nervosa. A filha escondeu da mãe que estava nervosa. Quando as palavras começaram, a mãe deixou cair uma lágrima emocionada. A filha engoliu as lágrimas emocionada. A filha esteve sempre ao lado da mãe excepto quando a mãe foi chamada para ser agraciada pelas mãos de um ex-aluno, agora homem maduro ao leme da terra que a mãe adoptou e que lhe retribuía neste dia. A mãe agradeceu entre o sorriso e as lágrimas as palavras sentidas do seu sempre aluno, agora homem feito e grato. A filha ficou orgulhosa, babada, feliz, exultante. A filha ficou comovida com as palavras que homenagearam a mãe. A filha veio para casa lutar com as palavras. A filha queria que elas contassem exactamente como foi. A filha procurou palavras. A filha vasculhou canhenhos de vocábulos vários. A filha deu por encerrada a busca. A alma da mãe não cabe em palavras e o reconhecimento não se transcreve em vocábulos. As palavras que fiquem para amanhã.
imagem: minha
foto: Sónia
Verdades insofismáveis
A Gemini with no place to go is a little like a beautiful bird in a gilded cage, anxious to fly free but unable to do so.
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