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domingo, 30 de novembro de 2008
sexta-feira, 28 de novembro de 2008
Menos é mais
Estou aqui a pensar se pouco será melhor que nada. Se menos é mais. Se escreva, se publique uma fotografia, tenho algumas para ver a luz do blogue, se procure uma citação nos livros, se recorra ao sitemeter, esse manancial de informação curiosa sobre quem se adentra na blogosfera e aterra aqui chamado por uma palavra ou expressão. Estou aqui a cogitar Posto? Escrevo? Vai a foto? Estou aqui a pensar se pouco será melhor que nada. Se menos é mais. Se escreva, se poste, se publique, se cite. Fico aqui a pensar.
quarta-feira, 26 de novembro de 2008
Receituário mensal
Ei-lo aqui
terça-feira, 25 de novembro de 2008
Terça-feira

Para ler o resto nada como ir ao PNETMulher. Há um crónica fresquinha à sua espera.
imagem: Richard Baumgart, The Writer.
segunda-feira, 24 de novembro de 2008
Entre o Pedro Rolo Duarte e o Sting
domingo, 23 de novembro de 2008
Ouçam como eu respiro
Entrem. A janela da sala está no basculante, sopra uma brisa suave, o sol ilumina a sala, as gatas saíram. Podem entrar. Sentem o perfume da manhã? A fragrância da alma lavada? Podem entrar. As portas estão abertas. Podem ver. Sentirão a vida sempre presente de vidas passadas, o carreiro de letras e o trilho da deambulação permanente. Entrem. Podem entrar. Agora ouçam como eu respiro*.
* indecentemente roubado a uma peça de teatro do Novo Grupo/Teatro Aberto.
As sombras, o bulício

Nas nossas ruas, ao anoitecer,
Há tal soturnidade, há tal melancolia,
Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.
Cesário Verde
foto: minha
sábado, 22 de novembro de 2008
Chitas e debruns
E num dia de coração magoado e alma triste, a primeira coisa que ocorreria a uma mulher seria encharcar-se em chocolates, nesta altura do ano os supermercados abarrotam de chocolates, a segunda, ir às compras, a terceira, uma novidade na vida desta vossa escriba, é que não pode, dê por onde der, sucumbir à debilidade anímica e derrubar-se sobre uma caixa de Guylian ou, caso se permitisse, uma pequena de Godiva, a quarta é que não deve ir às compras, a recessão entrará mais dia, menos dia, e a quinta é que é melhor adoptar uma actividade que não lhe ocupe neurónios em desmedida quantidade, que a mantenha alheada do mundo, de preferência sem notícias e televisão ligada e que seja, concomitantemente, ligeira, sedutora e que entretenha até o coração deixar de doer, a alma deixar de choramingar, a vontade de devorar os Guylian amansar e o ímpeto de escavacar o dinheiro em algo sempre utilíssimo a uma mulher, mas que jazerá moribundo no guarda-roupa, gaveta ou armário, desvanecer. E podia ter-me abraçado a um livro, improvável, calçado os ténis e fazer uma caminhada com o Atlântico do lado esquerdo para lá, uma paragem no miradouro, e o regresso com o Atlântico do lado direito, caso não estivesse roufenha e combalida desta maleita infernal que me apanhou desprevenida e atacou à traição, ou podia ter-me iniciado nas artes de fada do lar, ao que se chega para não comer chocolates ou derreter o vil metal, armada em rapariga prendada e talentosa, por um dia, unzinho, há que sonhar, e dedicar-me às chitas e gangas, gregas e debruns.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008
Propostas para Domingo
Levante-se tranquilo, respire o ar puro da manhã, enxote maus pensamentos e humores canídeos matinais, o banho pode ser antes ou depois, comece o pequeno-almoço sossegado, sugere-se acompanhado pelo exemplar da fotografia. São quase onze horas. Agora sintonize a Antena 1, está a ouvir o Pedro Rolo Duarte? Espere só mais um bocadinho e voilá, eis que esta vossa dedicada escriba dá voz às palavras aqui, ali, acolá e ainda por ali rabiscadas, escrevinhadas, sentidas e paridas.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008
Partidas

Histórias com livros dentro

Este do Jaime Bulhosa. Quem será o ladrão de poesia?
quarta-feira, 19 de novembro de 2008
Momento sitemeter (17)
O maior pénis do mundo foi procurado neste blogue.
Seria isto que procurava?
Seria isto que procurava?
Em cinco actos

Segundo, faço uma abordagem às artes gastronómicas num momento prévio de preparação, confiro os ingredientes na despensa e no frigorífico, elaboro uma lista de necessidades a satisfazer no périplo ao supermercado mais próximo e começo a magicar Aqui era capaz de não ficar mal uma pitada de orégãos ou Podia substituir o tomate ou Não vou pôr pimentos.
Terceiro, faço-me à vida e entro no supermercado, confirmo a lista de necessidades e, quando chego aos legumes, cruzo-me com a secção de cogumelos frescos, lanço um olhar de cobiça aos pleurotos. Mau grado a cor, levam-me aos míscaros da minha infância pela consistência e textura aparentemente carnuda. Reformulo mentalmente a receita, deixando para trás definitivamente os tomates e os pimentos e acrescentando-lhe os pleurotos É capaz de ficar bem. Rumo a casa.
Quarto, deito-me finalmente à fase alquímica da mescla de sabores, espreito o mar da janela da cozinha, olho-o sempre veneranda antes de me concentrar, a inspiração perfeita para que os sabores se liguem e amem, e começo finalmente, afastando pensamentos negativos ou estados de alma soturnos, não são compatíveis com manjares opíparos. Duas cebolas picadas, uma grande daria de igual forma, um dente de alho e um fio generoso de azeite, ou dois, o cozinheiro para o ser deve ser generoso nas porções e disciplinado no método. Ao som do frigir, corto a courgette em pedaços pequenos, as duas beringelas e vou-me finalmente aos pleurotos também cortados em pedaços sobre a tábua de madeira para os juntar ao refogado, entretanto condimentado com uma colher generosa de pasta de tomate e salpicados com rigor de orégãos e alecrim. Está a correr bem, penso. Na janela da cozinha deixo de contemplar o mar para ver a noite descer como um manto escuro pontilhado de estrelas, enquanto o perfume invade a cozinha. Numa ida breve ao frigorífico encontro mozzarella e ocorre-me a ideia de que talvez gratinado ficasse melhor Fica de certeza. Quinto, e ficou.
terça-feira, 18 de novembro de 2008
Terça-feira de novo

Ora espreitai o PNETmulher e deixai a vossa palavrinha.
segunda-feira, 17 de novembro de 2008
Denúncia capilar

Ontem não foi excepção. Acometida por um catarro, dores de garganta e febre, agora com esta provecta idade, deu-me para ter febre, outro remédio não tive se não dirigir-me ao Centro de Saúde para me deixar medicar contra este catarro aflitivo, raios o partam. Logo após o jogo do Benfica, assim ditou o ritmo no recato do lar e a minha temperatura inusitada, aí fui, irritada logo de casa. É que já não chega estar doente, ainda ter de me sujeitar ao parecer técnico, deslocar-me ao médico e escolher um clínico do Serviço Nacional de Saúde, caso seja necessário um atestado só pode ser passado por um médico do dito serviço, deixa-me, à partida, irada e farta, além de doente, traçando assim um quadro da maior harmonia.
Graças a Deus, Alá e Jah, tinha apenas uma pessoa à minha frente e fiquei mais tranquila quando soube que um dos médicos de serviço é rapaz de resposta rápida, competente e perspicaz, capaz de vislumbrar à légua as enfermidades, uma verdadeira Rosa Mota do atendimento. Quando uma vez tive uma reacção alérgica não se sabe exactamente a quê, enfiou-me com duas injecções que até vi estrelas, planetas, cometas, o sistema solar todinho e ainda galáxias desconhecidas, mas uma coisa é certa, curou-me. O atendimento foi também à velocidade da luz, de tal forma que saí meio vestida meio por vestir, que é lá isso, ocupar lugar nas urgências? para me derramar agarrada à nádega na primeira cadeira que encontrei cá fora.
Reconheci pela voz que seria o médico, o tal, que chamava pelo meu nome. Logo na entrada, olhou-me bem de frente e perguntou-me ao que vinha. Depois do queixume, há que aproveitar a oportunidade para largar queixas e lamúrias, rematou Pois e deixe-me adivinhar tem que falar muito… Pasmei Como é que sabe que sou professora, doutor? Tenho cara de professora? Atirou-me Cara e cabelo! Tendo em conta que tinha estado toda a tarde a dormitar no sofá a minha trunfa não estaria exactamente calma, nunca está, de resto. Quis saber como sabia que eu era professora, a curiosidade feminina é terrível, mas ele só me sorriu, bem-disposto e jocoso, para me deixar a matutar em como teria ele tido acesso a esta informação. À saída ainda me perguntou Então, também foi à manifestação? Já não se consegue passar anonimamente, há sempre uma trunfa que nos denuncia.
domingo, 16 de novembro de 2008
sábado, 15 de novembro de 2008
A biblioteca itinerante

A linguagem não verbal é um indicador mais fiável do que palavras múltiplas recheadas de aforismos, metáforas e oxímoros. Foi assim que, naquele dia pela manhã, percebi que a minha aluna Tatiana, com um ar sofrido, a voz arrastada e nas palavras que soltou, em total sintonia com o desespero da expressão do rosto luminoso, precisaria da minha ajuda.
Bem no início da aula, estava meio deitada sobre a carteira, ainda com a pilha de livros e dossiers por arrumar, quando se derramou ainda mais sobre a mesa, inclinou levemente a cabeça para o lado direito, espalhando os caracóis castanhos e brilhantes sobre os livros e soltou o lamento Setora, ó setora, olhe o livro que estou a ler. Nem um laivo de excitação nas palavras proferidas, nem uma pitada indelével de entusiasmo. Apenas a desilusão, a resignação perante mais esta provação que a escola aparentemente lhe propunha, o conformismo irremediável perante o livro pousado à sua frente, levemente tocado com os dedos à medida que soltava uma quase dor, uma aflição indiscutível. Quando lhe solicitei que me mostrasse o livro, veio indolente, como quem mostra ao pai ou à mãe um dói-dói à espera do beijo mágico com efeitos curativos poderosos Já passou? Já passou!
O livro estava intocado, tinha o preço marcado a lápis, uma edição dos Livros de Brasil que faria as delícias de alguns bibliófilos, e tinha aspecto de ter sido remetido para último lugar na estante da livraria através da selecção natural Tenho este e este da lista. Qual quer? Ah não, este não. A Tatiana acrescentou É tão chato, setora, não percebo nada disso. Quando questionei porque o lia, exactamente aquele e não outro qualquer, adiantou que teria ido à livraria com a lista de livros indicados para o seu ano de escolaridade e que, não havendo mais nenhum em stock, lhe venderam aquele.
E do livro não se questiona a qualidade, porém o efeito nefasto de rejeição da leitura começava a evidenciar-se na Tatiana. Pobre garota sentenciada à tortura de leituras dolorosas. Pedi-lhe a lista dos livros a ler. Entre eles uma quantidade avultada de lusófonos que dormiam tranquilos na minha estante, o contrário do que um livro deve ser, e prometi-lhe que no dia seguinte lhe levaria alguns. Os livros precisam de ser arejados e lidos. Nas primeiras linhas solta-se a empatia de que todas as leituras genuínas e prazeirosas devem ser feitas, sem intermediários nem imposições, assim seria pois, extensivo ao resto da turma que, entretanto, se me agarrou como a uma tábua de salvação contra livreiros gananciosos. E no dia seguinte levei o Manuel Rui, o Mia Couto, o Ondjaki e o José Eduardo Agualusa dispostos em camadas entre as capas de tecido. Viram, leram e escolheram. Alguns dos livros já voltaram. Com eles o regresso do alívio e das expressões sorridentes de que são feitas as adolescências felizes. O que é que uma professora não faz pelos seus alunos? Ler é prazer.
Bem no início da aula, estava meio deitada sobre a carteira, ainda com a pilha de livros e dossiers por arrumar, quando se derramou ainda mais sobre a mesa, inclinou levemente a cabeça para o lado direito, espalhando os caracóis castanhos e brilhantes sobre os livros e soltou o lamento Setora, ó setora, olhe o livro que estou a ler. Nem um laivo de excitação nas palavras proferidas, nem uma pitada indelével de entusiasmo. Apenas a desilusão, a resignação perante mais esta provação que a escola aparentemente lhe propunha, o conformismo irremediável perante o livro pousado à sua frente, levemente tocado com os dedos à medida que soltava uma quase dor, uma aflição indiscutível. Quando lhe solicitei que me mostrasse o livro, veio indolente, como quem mostra ao pai ou à mãe um dói-dói à espera do beijo mágico com efeitos curativos poderosos Já passou? Já passou!
O livro estava intocado, tinha o preço marcado a lápis, uma edição dos Livros de Brasil que faria as delícias de alguns bibliófilos, e tinha aspecto de ter sido remetido para último lugar na estante da livraria através da selecção natural Tenho este e este da lista. Qual quer? Ah não, este não. A Tatiana acrescentou É tão chato, setora, não percebo nada disso. Quando questionei porque o lia, exactamente aquele e não outro qualquer, adiantou que teria ido à livraria com a lista de livros indicados para o seu ano de escolaridade e que, não havendo mais nenhum em stock, lhe venderam aquele.
E do livro não se questiona a qualidade, porém o efeito nefasto de rejeição da leitura começava a evidenciar-se na Tatiana. Pobre garota sentenciada à tortura de leituras dolorosas. Pedi-lhe a lista dos livros a ler. Entre eles uma quantidade avultada de lusófonos que dormiam tranquilos na minha estante, o contrário do que um livro deve ser, e prometi-lhe que no dia seguinte lhe levaria alguns. Os livros precisam de ser arejados e lidos. Nas primeiras linhas solta-se a empatia de que todas as leituras genuínas e prazeirosas devem ser feitas, sem intermediários nem imposições, assim seria pois, extensivo ao resto da turma que, entretanto, se me agarrou como a uma tábua de salvação contra livreiros gananciosos. E no dia seguinte levei o Manuel Rui, o Mia Couto, o Ondjaki e o José Eduardo Agualusa dispostos em camadas entre as capas de tecido. Viram, leram e escolheram. Alguns dos livros já voltaram. Com eles o regresso do alívio e das expressões sorridentes de que são feitas as adolescências felizes. O que é que uma professora não faz pelos seus alunos? Ler é prazer.
imagem: Pablo Picasso, The Lesson
Um ano
O Pedro Rolo Duarte comemora hoje um ano de Pedro Rolo Duarte. Parabéns, Pedro.
Esta Lisboa que amamos

Desta vez não são posts a ler. São posts a ver. Este e este. Três perspectivas do mesmo lugar da Lisboa que amamos.
foto: minha
sexta-feira, 14 de novembro de 2008
Esta Lisboa que eu amo (1)
quinta-feira, 13 de novembro de 2008
Frases e palavras
Há dias em que me fogem palavras
e se me escapam frases.
Tento alinhavá-las como Lobo Antunes,
ceifo-lhes as vírgulas como Saramago,
desencanto uma tirada irónica como Mário de Carvalho
e remeto-me ao mais profundo silêncio
silêncio dos silêncios
prenhe de sinónimos puídos
e sons desengonçados
que se repetem como o eco
em gargalhada desabrida
desta que se ficou
sem palavras
nem frases.
e se me escapam frases.
Tento alinhavá-las como Lobo Antunes,
ceifo-lhes as vírgulas como Saramago,
desencanto uma tirada irónica como Mário de Carvalho
e remeto-me ao mais profundo silêncio
silêncio dos silêncios
prenhe de sinónimos puídos
e sons desengonçados
que se repetem como o eco
em gargalhada desabrida
desta que se ficou
sem palavras
nem frases.
quarta-feira, 12 de novembro de 2008
Momento sitemeter (16)
Não consigo precisar quem, mas alguém me advertiu que estes escritos ainda iriam imortalizar a personagem. Pois bem, alguém aqui bateu à porta à procura do Tibúrcio. Está bonzinho, tem sofrido de azia intensa, porém, as fichas de avaliação de professores não contêm GABAROLICE, um dos items em que o Tibúrcio teria EXCELENTE.
terça-feira, 11 de novembro de 2008
Dá-lhes, Manel
Tivemos de suportar muitos ministros durante a ditadura... Já não tenho paciência para o quero, posso e mando e isto não é suportável com o apoio do PS, que é um partido democrático. Manuel Alegre dixit.
A ler isto também.
Terça-feira

E assim faria, caso me bafejasse o tempo.
Para saber o que eu faria, nada como espreitar e comentar aqui.
foto: minha
domingo, 9 de novembro de 2008
Leituras blogosféricas (1)
Vale a pena ler este post. Muito bom.
sábado, 8 de novembro de 2008
sexta-feira, 7 de novembro de 2008
A primeira ou mais nenhuma
A filha chega a casa da mãe. Arremessa à entrada da porta o cansaço matinal, a ladainha de irritações, a pilha de desilusões acumuladas, fecha a porta apressadamente não vá a decepção fazer-se convidada para o almoço e entrar inadvertidamente pela frincha da porta. A filha chama Mami! A mãe não responde à filha. A filha ouve a mãe ao telefone. A filha pressente pela voz da mãe Algo não está bem. A filha ouve a voz da mãe algo inquieta, não era bem furiosa, não era bem irritada, não era bem zangada, mas algo não estava bem. A filha pensa Aconteceu alguma coisa, enquanto a voz da mãe se mantém assertiva e inflexível. A filha sabe Algo aconteceu. A filha inquieta-se Que será que aconteceu? A filha, sempre com a voz da mãe em fundo, inicia a confirmação de uma lista de possíveis energúmenos capazes de provocar na mãe o estado presente de inquietação. A filha pensa Quem foram os animais desta vez? A filha assume Foram os parvalhões dos colchões. A filha reitera Foram os anormais do clube de viagens. A filha enfurece-se Bem, se foram aquelas bestas a dizer que o Papá ganhou uma viagem outra vez… A filha conclui Se forem aqueles estúpidos é desta vez que apresento queixa na Deco. A filha tem a certeza Ai apresento, apresento, onde já se viu inquietarem a Mamã, onde já se viu ligarem para casa das pessoas a dizer que o Papá tinha ganho um sorteio como se andasse entre nós, o meu querido e saudoso Pai. A filha pragueja Estúpidos, parvalhões, bestas, anormais. A filha tem a certeza Ainda me passo e é desta que os mando abaixo de Braga três vezes. A filha sabe Ai mando, mando. A filha ouve a mãe com atenção, talvez descortine algo. A filha apura o ouvido Ora deixa cá ver, deixa cá ouvir bem… A mãe está a terminar a conversa, mas o tom de voz não muda, o tom de voz exprime a indignação. A mãe diz ao telefone. Agradecia, agradecia se faz favor. Obrigada. A mãe desliga o telefone. A filha pergunta aflita Mamã, o que foi, aconteceu alguma coisa? A mãe continua com o semblante carregado. A mãe responde Então não é que fui comprar A Viagem do Elefante, o último do Saramago... A filha responde Sim, eu sei e pensa E depois, mamã? Que te fizeram? Quem foi o energúmeno que te aborreceu? A mãe continua O livro saiu ontem. A filha concorda Pois foi. A mãe conta a história Comprei-o na livraria. A filha implica Mas que mania de ir àquela livraria, Mamã, já sabes como eles são. A mãe retorque Não é nada disso, foram até muito simpáticos. A mãe conclui E depois fui tomar café com a Dinha. A mãe remata E quando chego a casa vejo que o livro é a segunda edição. A filha pergunta E então, mamã? A mãe arremessa-lhe Uma segunda edição? O livro saiu hoje. Eu quero a primeira edição. Ora essa. A mãe não cede Não quero este. Quero a primeira edição. A filha põe água na fervura Mas se calhar esgotou, Mamã. A mãe não se dá por vencida, era só o que faltava Não esgotou nada, eles é que mandaram a segunda, diz-me a menina que para aqui só mandaram a segunda edição. Admite-se? Para a província mandam a segunda edição. Não quero! A filha acrescentou mais um elemento à sua lista de energúmenos em quem desancar, pegou nas chaves e ei-la a caminho dos distribuidores e livreiros. Uma segunda edição? É preciso ter lata. Onde já se viu.
quinta-feira, 6 de novembro de 2008
quarta-feira, 5 de novembro de 2008
Gebrauchsanweisung für Portugal

Gebrauchsanweisung für Portugal, assim se chama o livro. Traduzido à letra significa Instruções de Uso ou Manual de Instruções e fugindo quer aos manuais de instruções, quer aos comuns guias de viagem, o autor discorre sobre o país. Neste Manual de Instruções de Portugal, com o qual me cruzei em Munique há uma boa meia dúzia de anos, Eckhart Nickel é o escriba, Portugal o objecto da escrita e da escrita transparece o amor incondicional por este país de fadas - Märchenland-, assim o considera. A paixão por Portugal nasceu de forma fortuita, mas como todas as paixões, intensa e arrebatadora. Conta que, numa triste tarde de Dezembro de céu ameaçadoramente cinzento prometendo neve, ele e um amigo não conseguiam prosseguir com o trabalho entre mãos e que, ao procurar algo que os consolasse da inacção e invernia, depararam-se com uma garrafa de Vinho do Porto Niepoort na garrafeira da cave. O primeiro gole como um orgasmo. O Inverno lá fora esquecido e o desejo de conhecer mais sobre o país de origem dessa verdadeira poção mágica apresentou-se de imediato como um apelo irresistível, guiando posteriormente Eckhart Nickel a Portugal.
Poupar-vos-ei a traduções de qualidade duvidosa – traduttore=traditore – nas páginas deste livro encontro mais do que julgo sermos e, mesmo se, aqui e ali, espreita timidamente o paternalismo do país pequenino, como se quer um país de fadas, há um encanto permanente nas gentes, um fascínio pela História e pelos escritores, bem presente nas citações frequentes de Bernardo Soares, uma surpresa nos hábitos do quotidiano em que as novelas e a gastronomia ocupam lugar de destaque e, acima de tudo, um carinho imenso por este lugar que Nickel descobre e se redescobre a cada linha.
Texto repescado a propósito do livro.
terça-feira, 4 de novembro de 2008
Mais uma terça-feira
segunda-feira, 3 de novembro de 2008
Momento sitemeter (15)
A próxima vez que vir o Cristo perguntar-lhe-ei, assim já poderei responder à questão quantas chibatadas cristo levou, a entrada directa para este blogue por alguém além-mar.
Aos pares como os sapatos
Corria o ano da graça de dois mil e três, estava na aldeia desde Janeiro, dia último, quando o Pão-por-Deus se fez anunciar no calendário. Acorri à superfície comercial do costume e abasteci o lar de guloseimas. Também eu na minha infância tinha ido ao Pão-por-Deus e, na aldeia, imaginava que a criançada aparecesse.
No dia um a campainha da porta terá tocado entre as oito e meia e as nove e depois disso até cerca das doze não houve mais sossego. Vinham quase sempre cuidadosos e raramente se aventuravam pelo portão adentro, a menos que os chamasse. O saloio não é rapaz de abrir as portas da mansão aos forasteiros e até que deixem de o ser são submetidos a provas extenuantes. Eu, pobre de mim, nem sempre consegui ultrapassar as várias barreiras. A criançada também conhecia este código, a panóplia de provações até que as portas se abram. O que a criançada não sabia é que, sendo eu mestiça da alma, híbrida de raízes a norte e além-mar, dou graças a deus e ao meu avô que se enamorou de uma brasileira paulista que havia de ser minha avó e aos meus pais beirões de alma e de afectos, as portas de casa abrem sem mais. O saloio também é muito cioso do seu palácio que cuida com rigor e protege dos usos quotidianos, é assim que proliferam casinhas e anexos, nada como poupar a casa, mais invicta do que um museu. A criançada também sabia disso, chovia nesse dia distante e tinham medo de me sujar a casa com as pegadas de lama, o que não sabiam é que aqui no número nove vivem almas tranquilas quanto à conservação imaculada da habitação.
Numa das visitas apareceu-me um ser mínimo, provavelmente nem se contariam três anos de vida decorridos. Era castiça. São-no sempre as crianças desta idade. Vinha acompanhada pela progenitora, uma criatura de traços rudes e beiças grossas que se explanou numa pequena palestra sobre os hábitos e raízes do Pão-por-Deus para esta vossa humilde escriba, ser único em casa naquele dia. E falou, falou, falou. Acrescentou a profissão, professora do primeiro ciclo, valha-me a santa, não podia ser antes outra coisa qualquer, e quando no fim me dirigi à criança para lhe dar um beijo, a pespenica júnior afastou-me de repelão, é bom que não tenha filhos, se fosse minha, tinha levado logo uma reprimenda no momento, o reforço não se deve fazer esperar, mas a pespenica sénior ficou ufana perante a manifestação da pespenica júnior, o caso Casa Pia tinha despoletado no mês primeiro desse mesmo ano, e acrescentou triunfalmente qual Pigmalião encantado com a sua obra Ela não vai a estranhos. Era bom de ver que uma nunca vem sozinha. Deslocam-se aos pares para um efeito mais eficaz. Perante isto ainda estive para lhe sacar os chupas e rebuçados, entra-me pela casa dentro e ainda me chama estranha? Contive-me naturalmente. Anos depois a pespenica voltou, reconheço-a à légua, já deixou a pespenica sénior em casa agarrada à verruga, mas herdou dela o mesmo pôr e dispor, que, calculo impere na relação com os outros. Aqui no número nove, pespeniquice fica à porta.
No dia um a campainha da porta terá tocado entre as oito e meia e as nove e depois disso até cerca das doze não houve mais sossego. Vinham quase sempre cuidadosos e raramente se aventuravam pelo portão adentro, a menos que os chamasse. O saloio não é rapaz de abrir as portas da mansão aos forasteiros e até que deixem de o ser são submetidos a provas extenuantes. Eu, pobre de mim, nem sempre consegui ultrapassar as várias barreiras. A criançada também conhecia este código, a panóplia de provações até que as portas se abram. O que a criançada não sabia é que, sendo eu mestiça da alma, híbrida de raízes a norte e além-mar, dou graças a deus e ao meu avô que se enamorou de uma brasileira paulista que havia de ser minha avó e aos meus pais beirões de alma e de afectos, as portas de casa abrem sem mais. O saloio também é muito cioso do seu palácio que cuida com rigor e protege dos usos quotidianos, é assim que proliferam casinhas e anexos, nada como poupar a casa, mais invicta do que um museu. A criançada também sabia disso, chovia nesse dia distante e tinham medo de me sujar a casa com as pegadas de lama, o que não sabiam é que aqui no número nove vivem almas tranquilas quanto à conservação imaculada da habitação.
Numa das visitas apareceu-me um ser mínimo, provavelmente nem se contariam três anos de vida decorridos. Era castiça. São-no sempre as crianças desta idade. Vinha acompanhada pela progenitora, uma criatura de traços rudes e beiças grossas que se explanou numa pequena palestra sobre os hábitos e raízes do Pão-por-Deus para esta vossa humilde escriba, ser único em casa naquele dia. E falou, falou, falou. Acrescentou a profissão, professora do primeiro ciclo, valha-me a santa, não podia ser antes outra coisa qualquer, e quando no fim me dirigi à criança para lhe dar um beijo, a pespenica júnior afastou-me de repelão, é bom que não tenha filhos, se fosse minha, tinha levado logo uma reprimenda no momento, o reforço não se deve fazer esperar, mas a pespenica sénior ficou ufana perante a manifestação da pespenica júnior, o caso Casa Pia tinha despoletado no mês primeiro desse mesmo ano, e acrescentou triunfalmente qual Pigmalião encantado com a sua obra Ela não vai a estranhos. Era bom de ver que uma nunca vem sozinha. Deslocam-se aos pares para um efeito mais eficaz. Perante isto ainda estive para lhe sacar os chupas e rebuçados, entra-me pela casa dentro e ainda me chama estranha? Contive-me naturalmente. Anos depois a pespenica voltou, reconheço-a à légua, já deixou a pespenica sénior em casa agarrada à verruga, mas herdou dela o mesmo pôr e dispor, que, calculo impere na relação com os outros. Aqui no número nove, pespeniquice fica à porta.
domingo, 2 de novembro de 2008
Um ou três...
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